3 razões pelas quais precisamos suspender as patentes sobre as ferramentas médicas da COVID-19

Um ano desde a proposta, as farmacêuticas e uma minoria de governos ainda estão colocando lucros acima de vidas na pandemia

3 razões pelas quais precisamos suspender as patentes sobre as ferramentas médicas da COVID-19

Há um ano – e sete meses após o início da pandemia de COVID-19 – a Índia e a África do Sul apresentaram uma proposta de renúncia aos monopólios: uma solução inovadora para eliminar as barreiras de propriedade intelectual (PI) e garantir maior equidade no acesso a vacinas, tratamentos, diagnósticos e/ou outras ferramentas médicas necessárias para lidar com a COVID-19.

Desde que a proposta foi apresentada à Organização Mundial do Comércio (OMC), 3,6 milhões de pessoas perderam a vida. No ano passado, a solicitação de suspensão de patentes recebeu uma onda de apoio global e solidariedade de ativistas da sociedade civil e de mais de 100 governos, determinados a tornar a renúncia aos monopólios uma realidade.

Apesar desse apoio esmagador, uma pequena minoria de governos de alta renda não apoia a proposta ou apoia apenas uma versão reduzida. Por exemplo, a União Europeia e os EUA apresentaram contrapropostas que reduziriam drasticamente o escopo da solicitação de suspensão de patentes e limitariam seu potencial impacto. Essas contrapropostas buscam renunciar apenas às patentes das vacinas, deixando de fora as patentes e outros direitos de propriedade intelectual em diagnósticos, medicamentos e outras ferramentas, mantendo firmemente o controle de monopólios farmacêuticos.

Aqui estão 3 razões pelas quais os governos devem renunciar imediatamente a todos os direitos de propriedade intelectual em todas as ferramentas médicas da COVID-19:

1) As vacinas sozinhas não podem controlar a pandemia

Não há ‘balas de prata’ quando se trata da COVID-19: embora as vacinas desempenhem um papel fundamental no controle do vírus, elas são apenas uma das muitas ferramentas que precisamos para vencer esta pandemia.

Além das vacinas, o mundo precisa urgentemente de acesso a novos tratamentos e diagnósticos para reduzir o número de hospitalizações e mortes por COVID-19. Com a taxa de vacinação mais lenta e mais baixa em países de baixa e média renda devido a barreiras de acesso, há um risco maior de transmissão e disseminação de variantes, tanto local quanto globalmente.

Simultaneamente, os sistemas de saúde estão sendo levados ao limite pelas novas e contínuas ondas do vírus em todo o mundo, mais uma vez destacando a necessidade de melhorar o acesso ao diagnóstico e ao tratamento de pessoas com COVID-19, além de responder à pandemia com uma abordagem abrangente e diversa.

2) Patentes e direitos de propriedade intelectual já são uma barreira de acesso

Alguns tratamentos foram recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para o tratamento da COVID-19, e os monopólios farmacêuticos já estão se mostrando uma barreira para acessá-los.

O casirivimab e o imdevimab, recentemente recomendados pela OMS para o tratamento da COVID-19, pertencem à classe de medicamentos denominados anticorpos monoclonais (mAbs), que estão no mercado há décadas para outras doenças e costumam ter preços extremamente elevados. A Regeneron e a Roche (responsáveis pela precificação fora dos EUA) fixaram o casirivimab/imdevimab ao alto preço de US$ 820 na Índia (cerca de 4.480 reais), US$ 2.000 na Alemanha (cerca de 10.900 reais) e US$ 2.100 nos EUA (cerca de 11.400 reais).

Além disso, embora o casirivimab e o imdevimab tenham sido recomendados apenas recentemente, o Regeneron já começou a solicitar patentes dos medicamentos em pelo menos 11 países de baixa e média renda.

Os mAbs existentes costumam ter preços extremamente altos, e os desenvolvedores independentes de versões ‘biossimilares’ dos mAbs muitas vezes enfrentam barreiras de patentes e desafios regulatórios para introduzir seus produtos rapidamente para aumentar o fornecimento – algo que é desesperadamente necessário à medida que a COVID-19 continua a avançar em todo o mundo. Isso tornou a produção e o fornecimento de mAbs mais acessíveis historicamente difíceis e continua a minar o acesso ao tratamento da COVID-19.

Precisamos urgentemente aumentar a oferta global de medicamentos da COVID-19. Para fazer isso, mais fabricantes devem ser capazes de produzi-los por meio da renúncia de direitos de propriedade intelectual e do compartilhamento de tecnologia e conhecimento especializado por parte da indústria farmacêutica.

3) O fornecimento limitado de tratamentos é uma questão urgente

Assim como o casirivimab e o imdevimab, o tocilizumab e o sarilumab são mAbs recomendados pela OMS para o tratamento da COVID-19. Produzidos pelas empresas farmacêuticas Roche e Regeneron, respectivamente, tocilizumab e sarilumab são recomendados para o tratamento de pacientes com COVID-19 em estado grave e podem reduzir potencialmente a dependência de ventiladores médicos e oxigênio – ambos escassos em muitos dos ambientes onde MSF atua.

No entanto, devido aos preços altos e oferta limitada, esses novos tratamentos simplesmente não estão chegando a todos que precisam, como tem sido testemunhado por equipes de MSF em todo o mundo.

“Nos últimos meses, testemunhamos, impotentes, pessoas no sul da Ásia enfrentado dificuldades para conseguir tocilizumab para pacientes com casos graves de COVID-19”, conta Leena Menghaney, conselheira global de PI da Campanha de Acesso de MSF.

Conclusão:

Não podemos esperar mais. A pandemia é uma crise crescente em muitos países em desenvolvimento e não podemos aceitar que países que já vacinaram a maioria de sua população elegível, enquanto estocam vacinas, paralelamente às empresas farmacêuticas que até agora se recusaram a compartilhar totalmente sua tecnologia e conhecimento especializado, bloqueiem também o acesso a outras ferramentas médicas.

Existe uma solução na suspensão de patentes e outros direitos de propriedade intelectual apoiada por mais de 100 governos em todo o mundo: mas uma pequena minoria de países de alta renda vergonhosamente continua a bloqueá-la ou a oferecer alternativas ineficazes.
O mundo já perdeu um ano inteiro em que inúmeras vidas poderiam ter sido salvas com o aumento equitativo do acesso global às ferramentas médicas da COVID-19.

É hora de TODOS os governos apoiarem esta proposta inovadora e apoiar a renúncia aos monopólios para salvar vidas.

 

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