5 motivos para falarmos sobre a tuberculose

Estigmatizada e silenciosa, a tuberculose continua sendo a doença infecciosa mais mortal do mundo, apesar de já haver diagnóstico e tratamento.

5 motivos para falarmos sobre a tuberculose

A tuberculose (TB) é uma das maiores crises globais de saúde existentes, e levou à morte de 1,4 milhão de pessoas em 2019. Essa é a doença infecciosa mais mortal do mundo, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS). Tratamentos ultrapassados, a falta de uma vacina eficaz e de ferramentas de diagnóstico adequadas tornam difícil o controle da epidemia global da TB. Alguns ganhos foram obtidos nos últimos anos: os primeiros novos medicamentos em meio século contra a doença e o ensaio de um tratamento mais curto para a tuberculose resistente a medicamentos (DR-TB). No entanto, a dura realidade continua: 10 milhões de pessoas adoeceram com tuberculose em 2019 e quase meio milhão desenvolveram DR-TB, que é muito mais difícil de tratar. A maioria não é diagnosticada e, portanto, não é tratada.

Veja 5 breves fatos sobre essa doença mortal:

1 – Dificuldades de diagnóstico

O teste mais amplamente utilizado para o diagnóstico da TB ativa nos países em desenvolvimento se baseia no exame da mucosa do paciente sob um microscópio. Este método, desenvolvido há quase 140 anos, detecta menos da metade de todos os casos de TB e em grande parte não consegue identificar a doença em crianças, pessoas co-infectadas com HIV – que geralmente não são capazes de produzir a expectoração necessária – e aqueles com resistência aos medicamentos de tuberculose. Um teste de diagnóstico, Xpert MTB/RIF, foi implementado e o usamos em muitos de nossos projetos, mas sua utilização não é possível em contextos com recursos limitados.

No Brasil, diante da pandemia de COVID-19, muitos pacientes já diagnosticados e em tratamento contra a tuberculose tiveram dificuldade de continuar com suas consultas, uma vez que houve uma redução dos recursos e da aplicação de políticas governamentais contra a TB. Além disso, o quadro de profissionais de saúde foi reduzido, pois muitos foram alocados no combate à pandemia. O diagnóstico precoce da tuberculose também foi afetado, o que pode mascarar ainda mais a verdadeira situação da doença no país.

“Em vez de intensificar os cuidados contra a TB, corremos o risco de retroceder devido à COVID-19”, diz Sharonann Lynch, consultora sênior de políticas de tuberculose para a Campanha de Acesso de MSF. “É urgente que os governos e doadores intensifiquem seus esforços para que inovações e ferramentas médicas cheguem às pessoas com tuberculose. Finalmente temos medicamentos e testes melhores para combater e prevenir esta doença extremamente infecciosa, mas curável, então é incompreensível e inaceitável que eles ainda não estejam sendo usados para salvar o maior número de vidas possível. ”

2 – Tratamento árduo

O tratamento para TB sem complicações leva no mínimo seis meses. Para a TB resistente a medicamentos (DR-TB), a terapia requer a ingestão de um coquetel de medicamentos e pode levar dois anos ou mais, mas os ensaios estão em andamento para tratá-la em seis a nove meses. É vital que o paciente conclua todo o processo, mesmo quando começa a se sentir melhor. O tratamento incompleto pode levar ao desenvolvimento de resistência aos medicamentos. A descentralização da terapia, com pessoas sendo cuidadas em casa, pode ajudar os pacientes a aderir ao tratamento e superar quaisquer obstáculos que possam enfrentar.

 “Passei por uma jornada agonizante sendo tratada com medicamentos com efeitos colaterais terríveis e perdi um dos meus pulmões”, informa Meera Yadav, sobrevivente de tuberculose amplamente resistente aos medicamentos (XDR-TB), em Mumbai, na Índia. “Finalmente, em 2016, consegui acessar novos medicamentos para tuberculose como parte do regime que salvou minha vida. Não quero que mais ninguém passe por essa provação. Com medicamentos mais novos, agora é possível oferecer às pessoas um tratamento oral mais eficaz. Pacientes com TB não podem mais ser excluídas do acesso a essas inovações, especialmente quando têm medo de visitar centros de tratamento devido à COVID-19. ”

3 – Formas resistentes da doença

Quando os pacientes são resistentes aos dois antibióticos de primeira linha mais potentes (isoniazida e rifampicina), eles são considerados portadores de tuberculose multirresistente (MDR-TB). O tratamento é longo e árduo e os medicamentos têm potencial para provocar muitos efeitos colaterais, incluindo psicose e surdez. As pessoas podem tomar até 20 comprimidos por dia durante dois anos, apenas para ter uma taxa de cura de pouco mais da metade. A forma ultrarresistente da TB (XDR-TB) ocorre quando um paciente é resistente a medicamentos de segunda linha. Menos de um terço das pessoas com XDR-TB são curadas.

“Os medicamentos afetaram minha audição e visão, perdi o apetite e consequentemente muito peso. Eu costumava acordar às cinco ou seis da manhã com dores estomacais e chorava ao ver aquelas pílulas. Foi muito difícil”, diz Sergey, de 40 anos, que fazia parte do programa de tratamento para pacientes com tuberculose multirresistente (MDR-TB), uma colaboração entre o Dispensário Regional de TB em Zhytomyr e Médicos Sem Fronteiras (MSF). Em outubro de 2020, após 13 anos de seu primeiro diagnóstico positivo para TB, Sergey foi liberado do Dispensário Regional de TB em outubro de 2020.

4 – Há novos medicamentos, mas falta acesso

A maioria dos medicamentos para tratar a tuberculose são antigos e tóxicos. Mas na última década, a bedaquilina, o delamanid e, mais recentemente, o pretomanid, foram desenvolvidos, dando aos pacientes esperança e mais opções no tratamento da doença. No entanto, a disponibilidade desses fármacos para pacientes que necessitam deles tem sido extremamente lenta. Estimamos que, em 2016, apenas cerca de uma a cada oito pessoas com DR-TB que poderiam ter sido beneficiadas por estes novos medicamentos vitais foi tratada com eles.

Nandita Venkatesan perdeu a audição como efeito colateral de um medicamento ultrapassado para a tuberculose. Ela foi obrigada a tomá-lo porque um medicamento mais novo e mais eficaz, a bedaquilina, era muito caro. A empresa que detém sua patente, a Johnson & Johnson (J&J), recusou-se a baixar o preço. A experiência de Nandita a levou a lutar na Índia e em todo o mundo para garantir que outras pessoas que vivem com tuberculose não tenham que enfrentar a escolha que ela enfrentou: ficar surda ou morrer.

O impacto dos monopólios no acesso a medicamentos para tuberculose é gigantesco. A empresa farmacêutica J&J está usando a patente da bedaquilina para bloquear a produção de versões genéricas mais acessíveis do medicamento até que este direito se esgote, o que ocorre em 2027, no caso da Índia. Cerca de 1 em cada 9 pessoas que vivem com tuberculose ainda não pode obter este medicamento, em grande parte, devido aos preços elevados e às patentes que estão impedindo a fabricação de alternativas mais acessíveis.

5 – Pesquisas para novos tratamentos

A maioria dos medicamentos usados para tratar a TB tem décadas, alguns não foram originalmente desenvolvidos para uso com TB ou têm efeitos colaterais tóxicos, e o próprio tratamento para DR-TB leva dois anos. Nesse contexto, a pesquisa de novos regimes de medicamentos, mais curtos e mais eficazes é urgentemente necessária. MSF está participando de dois ensaios clínicos, EndTB e PRACTECAL, para encontrar novos regimes de tratamento. Os dois ensaios inscreveram seus primeiros pacientes até o final de março de 2017.

Em 2017, nosso primeiro paciente com TB terminou com sucesso seu tratamento no projeto de MSF na Bielorrússia. Yury, de 38 anos, tinha uma forma de TB que era resistente a medicamentos. Após dois anos de um tratamento que não estava funcionando, ele ficou sem outras opções, até que MSF iniciou um novo programa no país, em 2015. “Meus médicos me disseram que esta era minha única chance. A doença estava ficando cada vez pior. Eles me disseram que os medicamentos existentes não iriam ajudar’, recorda.

Yury foi admitido no programa de MSF, pertencente à parceria EndTB, que tem o objetivo de desenvolver tratamentos mais curtos, menos tóxicos e mais eficazes para a TB resistente a medicamentos. Yury foi colocado em um novo regime que continha bedaquilina, um medicamento ao qual ele não tinha acesso anteriormente. “Comecei a melhorar imediatamente. Antes, eu não me sentia bem, não tinha apetite. Mas os testes, as radiografias… todos ficaram surpresos! Eles disseram que foi um progresso fantástico e, claro, insistiram para que eu não parasse com o tratamento”, disse Yury.

 

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