A cada três minutos, uma criança morre devido à tuberculose

A MSF insta a investimentos sustentados para combater a tuberculose em crianças, que são as mais vulneráveis na crise global de financiamento da saúde

Uma família de 16 membros que está a ser tratada para a tuberculose resistente a medicamentos no hospital de tuberculose da MSF em Kandahar, no Afeganistão.
©️Noor Ahmad Saleem/MSF

No Dia Mundial de Combate à Tuberculose, a Médicos Sem Fronteiras (MSF) urge que todos os países e doadores internacionais priorizem e garantam investimentos sustentados no diagnóstico, tratamento e na prevenção da tuberculose (TB) para todos – especialmente para as crianças, que continuam a ser as mais vulneráveis à doença.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que 1,25 milhão de crianças e adolescentes jovens (com idade entre 0 e 14 anos) adoeçam com tuberculose todos os anos, mas que apenas metade dessas crianças seja diagnosticada e notificada aos programas nacionais contra a doença. As lacunas são ainda mais graves para as crianças afetadas pela TB resistente a medicamentos, com mais de 85% sem diagnóstico e tratamento.

A cada três minutos, uma criança morre de TB – uma doença que é curável. Em 2022, a OMS reviu as suas diretrizes para a gestão da tuberculose em crianças e adolescentes, de maneira a alinhar as diretivas com as evidências científicas mais recentes. Caso postas em prática, essas diretrizes podem melhorar drasticamente os diagnósticos, a qualidade dos cuidados e salvar vidas.

 

Ninguém deveria morrer ou sofrer de uma doença evitável e tratável.”

 

O projeto TACTiC da MSF (Testar, Evitar e Curar TB em Crianças, na sigla em inglês) está a utilizar as novas recomendações da OMS em mais de uma dúzia de países em África e na Ásia e já documentou um aumento no número de crianças diagnosticadas com TB e submetidas ao tratamento adequado.

Imagem dos medicamentos utilizados para o tratamento da tuberculose resistente a medicamentos (DR-TB).
Imagem dos medicamentos utilizados para o tratamento da tuberculose resistente a medicamentos (DR-TB). ©️ Ammar Obeidat/MSF

 

As vítimas mais vulneráveis dos cortes de financiamento

As crianças com tuberculose já enfrentam os maiores obstáculos no acesso aos cuidados e serão as primeiras e mais vulneráveis vítimas dos recentes cortes de financiamento dos Estados Unidos (EUA), tanto a curto como a longo prazo, o que preocupa profundamente a MSF. Os EUA são o maior financiador de programas contra a doença, uma vez que o país representa metade de todos os financiamentos internacionais e bilaterais, segundo a OMS. As crianças com sistemas imunitários enfraquecidos, por exemplo, devido à infeção pelo VIH ou à desnutrição, são as mais vulneráveis e, por isso, serão desproporcionalmente afetadas pela interrupção dos serviços de TB, VIH e nutrição.

“Durante anos, testemunhámos as lacunas mortais que impedem as crianças de aceder ao diagnóstico e tratamento da TB nos países onde trabalhamos”, afirmou a responsável pelo grupo de trabalho da MSF sobre tuberculose, Cathy Hewison. “As crianças com risco de ter TB são frequentemente negligenciadas, seja por não serem diagnosticadas ou por enfrentarem atrasos no diagnóstico. Agora, com os recentes cortes de financiamento dos EUA, essas lacunas na identificação e tratamento de crianças com TB irão aumentar, o que ameaça reverter anos de progresso nos cuidados da TB. Apelamos urgentemente a todos os países e doadores internacionais para que intensifiquem os esforços e garantam financiamento sustentável para o tratamento da TB para todos, especialmente para as crianças pequenas. Ninguém deveria morrer ou sofrer de uma doença evitável e tratável.”

 

Uma enfermeira MSF dá medicação para tuberculose (TB) a Zainab, que está a ser tratada para TB resistente a medicamentos no hospital de TB em Kandahar, no Afeganistão.
Uma enfermeira MSF dá medicação para tuberculose (TB) a Zainab, que está a ser tratada para TB resistente a medicamentos no hospital de TB em Kandahar, no Afeganistão. ©️Noor Ahmad Saleem/MSF

 

Impacto dos cortes no Paquistão

As equipas da MSF na província de Sindh, no Paquistão, estão a testemunhar como estes cortes de financiamento estão a levar à interrupção dos serviços comunitários, que desempenham um papel fundamental num país com uma elevada carga de tuberculose, especialmente na triagem ativa da população, o que aumenta os diagnósticos, na triagem de famílias de alto risco e na oferta de tratamento preventivo da TB para crianças.

“As crianças já são altamente vulneráveis à TB, e estamos preocupados com o facto dos cortes de financiamento dos EUA, que afetaram os serviços comunitários, terem um impacto desproporcional sobre as crianças, e que levem a um aumento no número de casos e a mais mortes evitáveis”, ressalva a coordenadora médica da MSF no Paquistão, Ei Hnin Hnin Phyu. “Não podemos permitir que decisões de financiamento custem as vidas de crianças.

As crianças com tuberculose são frequentemente excluídas dos ensaios de investigação e desenvolvimento de novas ferramentas para o tratamento da doença. Os recentes cortes de financiamento dos EUA interromperam inúmeros ensaios clínicos – muitos dos quais são cruciais para as crianças com tuberculose – e atrasaram a investigação e a inovação na luta contra a TB. Este é um grande retrocesso no combate à doença, e atrasa o desenvolvimento de diagnósticos e tratamentos urgentes para as crianças. A MSF apela à indústria farmacêutica e aos doadores internacionais para que garantam investimentos sustentados no desenvolvimento e na avaliação de ferramentas médicas que possam melhorar os cuidados com a tuberculose infantil.

 

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MSF e a luta contra a tuberculose

A Médicos Sem Fronteiras (MSF) é a maior prestadora não governamental de tratamento da tuberculose no mundo e está envolvida no cuidado da doença há 30 anos, frequentemente a trabalhar ao lado das autoridades nacionais de saúde para tratar as pessoas nos contextos mais diversos, incluindo zonas de conflito, bairros urbanos pobres, prisões, campos de refugiados e áreas rurais.

A MSF também tem participado nos esforços para encontrar regimes de tratamento mais curtos e seguros para a TB resistente a medicamentos através de três ensaios clínicos: TB-PRACTECAL, endTB e endTB-Q. As recomendações da OMS para quatro regimes de tratamento de 6 e 9 meses (incluindo BPaLM e BPaL) para a TB resistente a medicamentos foram impulsionadas principalmente pelos resultados dos ensaios TB-PRACTECAL e endTB.

A MSF está a conduzir um projeto integrado, TACTiC (Testar, Evitar e Curar TB em Crianças, na sigla em inglês) que visa concretizar as novas recomendações da OMS para melhorar a gestão da TB infantil nos programas da Médicos Sem Fronteiras em mais de uma dúzia de países, em África e na Ásia. Além disso, objetiva demonstrar a validade e viabilidade das recomendações em diferentes contextos nacionais através da investigação operacional e também defender a execução do projeto de maneira generalizada nos sistemas de saúde nacionais.

 

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