Cerca de 1.500 pessoas dormiram ao relento sob chuva na fronteira entre a Sérvia e a Croácia

Sem condições de recepção, “terra de ninguém” recebeu 3 mil pessoas em um só dia, que tiveram de enfrentar condições precárias

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Na última noite, mais de 3 mil pessoas enfrentaram uma madrugada sem acesso a abrigo ou instalações de higiene na fronteira entre a Sérvia e a Croácia, segundo a organização humanitária internacional Médicos Sem Fronteiras (MSF).

Após o fechamento da fronteira da Hungria com a Croácia e decisão das autoridades eslovenas de admitirem um máximo de 2.500 pessoas por dia, milhares foram abandonados em condições extremamente caóticas no ponto de trânsito de Barkasovo/Bapska entre a Sérvia e a Croácia. Entre 1h30 e 6h30 de hoje, horário local, nenhum ônibus transportava pessoas para a Croácia, e dezenas deles, vindo da Antiga República Iugoslava da Macedônia (FYROM, em inglês), ainda chegavam regularmente ao lado sérvio da fronteira. A Grécia está aumentando o número de pessoas nas zonas de trânsito e provocando um gargalo que poderia gerar ainda mais tensão em um futuro próximo.

“Nesta noite, ficamos muito próximo do tipo de evento dramático que tanto tememos em Berkasovo/Bapska. Cerca de 3 mil pessoas vulneráveis foram deixadas no frio, em meio à terra de ninguém, entre fronteiras, sem abrigo ou assistência. No final da tarde, os ônibus retomaram o transporte de pessoas à Croácia, mas os números que estão sendo colocados nesse jogo de chadrez europeu submeterão esse grupo de pessoas a futuras crises, sem dúvidas. Nós já observamos uma quase crise desse tipo em Idomeni, Presevo, Horgos, e agora em Berkasovo/Bapska. Com o efeito dominó provocado pelo fechamento das fronteiras europeias, deixando pessoas à mercê das tempaeraturas que começam a baixar, todos os países que abrigam refugiados e imigrantes devem, no mínimo, garantir condições básicas de sobrevivência a essas pessoas”, diz Aurelie Ponthieu, especialista no deslocamento de populações de MSF.

Com uma média de 5 mil pessoas transitando por dia, na noite de 18 de outubro, cerca de 1.500 pessoas, incluindo famílias, crianças e idosos, passaram a noite ao relento sem abrigo enfrentando o frio e a chuva. Devido à falta de estruturas apropriadas, algumas pessoas dormiram debaixo de lonas plásticas. Bebês e crianças, principalmente da Síria e do Afeganistão, foram obrigados a dormir sob a chuva.

“Há alguns dias, Bapska/Berkasovo era apenas um ponto de trânsito para milhares de refugiados indo em direção à Alemanha e ao norte da Europa, mas, após as autoridades húngaras decidirem fechar suas fronteiras, atrasos na travessia deixaram pessoas encurraladas com o mínimo de condições de abrigo, sanitárias e de higiene”, diz Francisca Silva, consultora humanitária na Sérvia. “As pessoas estão extremamente nervosas; tensões entre grupos de refugiados estão crescendo, mães estão chorando com seus filhos nos braços, preocupadas com a possibilidade de perder a chance de cruzar a fronteira. As autoridades estão concentrando todos os seus esforços para atravessar as pessoas para a Croácia, mas também devem oferecer um nível básico de assistência.”

Equipes de MSF oferecendo cuidados de saúde primária por meio de duas clínicas móveis estão observando casos crescentes de hipotermia e doenças relacionadas às más condições climáticas. Cobertas, luvas e jaquetas foram distribuídas e as equipes estão negociando com autoridades locais para que ofereçam abrigo urgentemente.

“O que estamos observando é o efeito da falta de coordenação e liderança, que está deixando refugiados vulneráveis sem abrigo e apoio de que precisam desesperadamente”, diz Elisabetta Faga, coordenadora de emergência de MSF nos Balcãs. “É preciso oferecer urgentemente condições de trânsito adequadas neste momento, porque com as chegadas vindas da Grécia e da FYROM em andamento, a situação só pode piorar, com o risco de as tensões em outros lugares também aumentarem nos próximos dias e horas. Após fugir de conflitos e arriscar suas vidas viajando por terra e mar, bebês, crianças, mulheres grávidas e pessoas com deficiências estão abandonadas sem assistência apropriada. Enquanto esperam para cruzar as fronteiras, as pessoas precisam e merecem assistência humanitária básica, incluindo acesso a alimentos, abrigo, água e banheiros.”

A menos que medidas de proteção adequadas sejam postas em prática urgentemente, MSF alerta que milhares de gestantes, crianças pequenas e idosos serão expostos a condições extremamente desafiadoras durante este inverno, com implicações potencialmente fatais. MSF está se preparando para atender um grande número de pacientes, recrutando mais profissionais médicos e ampliando seu estoque de cobertas, capas de chuva, e roupas de inverno. As condições de higiene tendem a se deteriorar durante o inverno porque as pessoas não têm lugar para tomar banho ou lavar suas roupas, resultando em um aumento de doenças de pele e piolhos. Por isso, as equipes também estão preparando kits de higiene.

 “Milhares de pessoas vulneráveis continuam expostas a condições dramáticas em sua jornada pelos Balcãs”, diz Aurelie Ponthieu. “A falta de serviços básicos já está tendo um impacto na saúde dessas pessoas, e a situação só irá piorar neste inverno sem abrigos, alimentos quentes e instalações de higiene apropriadas nos pontos de registro e transporte não forem rapidamente oferecidos. Não podemos esperar um evento dramático acontecer. Condições de trânsito seguras e adequadas, adaptadas às baixas temperaturas que se aproximam, devem ser garantidas agora.”

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