Crise na R. D. Congo: como é que estamos a prestar apoio?

Após violentos combates e ordens de evacuação do grupo armado M23/AFC, filas intermináveis de homens, mulheres e crianças surgiram nas estradas de Goma

Pessoas em deslocação RDCongo
© Daniel Buuma, 2025

Centenas de milhares de pessoas estão a abandonar os campos de deslocados nos arredores de Goma, na República Democrática do Congo (RDC), após violentos combates e ordens de evacuação do grupo armado Mouvement du 23 Mars / Alliance Fleuve Congo (M23/AFC).

Em resposta à crise, a Médicos Sem Fronteiras (MSF) adaptou as atividades da organização na região, mobilizando equipas para apoiar pessoas que, uma vez mais, se vêem forçadas a deslocar-se em massa. Muitos dos que retornam às cidades de origem enfrentam condições incertas e perigosas.

A paisagem de Goma, capital da província de Kivu Norte, mudou drasticamente em poucas semanas. Antes da tomada da cidade pelo M23/AFC, no final de janeiro, Goma abrigava cerca de 650 mil pessoas deslocadas internamente – a maioria a viver em acampamentos improvisados nos arredores – além dos 2 milhões de residentes da cidade.

Alguns acampamentos começaram a ficar desocupados, à medida que os combates se intensificaram no final de janeiro. Agora, praticamente todos foram abandonados após ordens para que as pessoas retornassem aos locais de origem.

Pessoas deslocadas em Goma
A MSF estabeleceu clínicas móveis para prestar apoio às pessoas que começaram a abandonar os campos de Goma. © Daniel Buuma, fevereiro 2025.

Enquanto algumas pessoas deslocadas optaram por ficar perto de Goma, a maioria partiu para Norte ou Oeste, em direção a territórios vizinhos, sem saber o que esperar. Em poucos dias, formaram-se nas estradas filas intermináveis de homens, mulheres e crianças, carregando o pouco que podiam a pé, de mota ou de autocarro. Alguns pacientes da MSF relataram-nos que, às vezes, caminhavam durante dias a fio sem acesso a comida ou água.

“Face a estas grandes movimentações, enviámos equipas ao longo das rotas de retorno para avaliar as unidades de saúde que poderiam ficar sobrecarregadas por esse súbito aumento de pacientes”, explica o responsável pelas atividades das clínicas móveis, Anthony Kergosien.

“Em todos os lugares, encontramos a mesma realidade: unidades de saúde que já eram precárias antes da crise estão agora abandonadas ou, pior ainda, foram destruídas ou saqueadas. E agora espera-se que essas mesmas instalações consigam responder a um grande número de pessoas e a um risco de propagação de doenças como a cólera, Mpox e sarampo, que já estavam presentes nos acampamentos”, relata Kergosien.

Com base nas avaliações iniciais, as equipas da MSF começaram a fornecer equipamentos e medicamentos e a enviar profissionais para mais centros de saúde nos territórios de Nyiragongo e Masisi. As nossas equipas estabeleceram também clínicas móveis em áreas de difícil acesso para providenciar apoio médico gratuito às pessoas que estão em trânsito.

 

Necessidade urgente de melhorar as condições para pessoas deslocadas

Crise na República Democrática do Congo
“Não sei o que me espera em Makombo. Tenho medo e estou cansada”, confessa Esperance, 30 anos. © Daniel Buuma, fevereiro 2025.

Uma das instalações apoiadas pela MSF é centro de saúde de referência em Sake, uma pequena vila localizada a 25 quilómetros de Goma. Sake tem sido palco de intensos confrontos nos últimos anos devido à sua localização estratégica: é um ponto de passagem essencial para as pessoas que viajam em direção a Oeste, para a cidade de Masisi; a Norte, para Kitchanga; e a Sul para Minova e Kivu Sul.

“Os habitantes estão a regressar a Sake e a cidade tornou-se no único ponto de conexão para aqueles que retornam ao território de Masisi ou a Kivu Sul, após deixarem os acampamentos em Goma”, explica Kergosien.

Por isso decidimos levar a cabo remodelações de emergência no centro de saúde, que havia sido severamente danificado durante os últimos combates. Também reconstruímos a unidade de tratamento de cólera, que, atualmente, atende cerca de 20 pacientes por dia”, acrescenta.

Agora, são realizadas quase 200 consultas médicas por dia no centro de saúde, principalmente para infeções respiratórias e doenças diarreicas. Mas também são providenciadas consultas para casos de Mpox e pacientes que procuram cuidados após sofrerem violência sexual.

Sake, Goma, República Democrática do Congo
Agente comunitária fornece informações a pacientes deslocados pelo conflito no centro de saúde em Sake. © Daniel Buuma, fevereiro 2025.

A partir de Sake, as equipas da MSF lançaram serviços médicos móveis e apoiaram outras unidades de saúde ao longo das estradas montanhosas. O acesso a cuidados de saúde gratuitos é crucial para as pessoas que regressam dos acampamentos, especialmente quando se encontram num estado de extrema vulnerabilidade, muitas vezes sem dinheiro ou alimentos e, em alguns casos, sem ferramentas para recomeçar.

“Estou de regresso a Kabati há uma semana. A situação está tranquila, mas a fome é um problema real”, diz Bigirimana, que passou dois anos no acampamento de Bulengo antes de regressar a casa. “Precisamos de remédios. A maioria de nós está doente – há muitos casos de diarreia, especialmente entre as crianças.”

“Os riscos ligados à insegurança alimentar são graves, por isso é que restabelecemos várias unidades de nutrição terapêutica”, frisa o responsável pelas clínicas móveis da MSF. “Além disso, enfrentamos a ameaça de epidemias que estavam concentradas em Goma. É urgente melhorar as condições de vida, bem como o acesso a serviços essenciais nas áreas de retorno e intensificar o apoio humanitário. Infelizmente, pouquíssimas organizações estão a trabalhar nessas regiões”, alerta Kergosien.

À data de 26 de fevereiro, as equipas móveis da MSF estavam a apoiar unidades de saúde em áreas remotas como Buhumba, Kilolirwe, Sake, Kingi, Luhonga e Makombo.

Paralelamente, a MSF continua a prestar cuidados em vários centros de saúde e hospitais em Kivu Norte, ao mesmo tempo que providencia assistência a feridos nos hospitais de Kyeshero e Virunga.

Também continuaremos a apoiar diversas instalações em Goma, que fornecem cuidados primários de saúde, tratamento de desnutrição e tratamento de cólera, além de atendimento para sobreviventes de violência sexual.

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