Médico conta como foi o trabalho de MSF na Região Serrana

Sérgio Cabral

"Percebemos que seríamos muito mais úteis preparando os psicólogos"

O pediatra Sérgio Cabral que coordenou o trabalho de Médicos Sem Fronteiras (MSF) na Região Serrana fala em entrevista sobre a atuação da equipe na região e da opção de oferecer treinamento para os psicólogos que estão atendendo pessoas afetadas pela catástrofe. Depois de capacitar mais de 130 profissionais de saúde mental, Médicos Sem Fronteiras se prepara para deixar o local com a certeza de que seu trabalho terá continuidade.

Por que MSF decidiu atuar na Região Serrana?
Sérgio Cabral – Nós viemos logo após as enchentes para fazer uma avaliação da situação. Percebemos que havia uma grande catástrofe, o volume de pessoas afetadas era enorme e que a experiência de MSF em situações semelhantes poderia ser muito útil.

Que tipo de trabalho MSF está fazendo?
Cabral – Formamos duas equipes com médicos, psicólogos e uma enfermeira para prestar serviço direto à população, mas o que a gente percebeu, até nos lugares mais distantes, é que havia muita gente ajudando, mas notamos que os cuidados com a saúde mental eram praticamente inexistente. Então decidimos atuar nessa área.

Como vocês estão fazendo isso?
Cabral – Há excelentes profissionais da saúde mental na região, mas boa parte estava se sentido perdida porque não tinham treinamento específico para atuar em situações como essa. Começamos a fazer reuniões para organizar esses grupos de psicólogos que estavam atuando em diferentes lugares de Nova Friburgo e, junto com eles, chegamos à conclusão de que o caminho era capacitar esses profissionais. Com base em experiências internacionais anteriores, montamos uma capacitação rápida. Percebemos que seríamos muito mais úteis preparando esses psicólogos que estarão espalhados na região atendendo centenas de pessoas – e às vezes até repassando para outros psicólogos esse conhecimento – do que atendendo ao público diretamente. Esses profissionais trabalham em organizações, universidades, conselhos e na rede pública.

Quanto psicólogos de MSF estão fazendo esse trabalho?
Cabral – Estamos com três psicólogas. Não é um número grande, mas é suficiente para o momento. Um psicólogo tem um alcance muito grande quando trabalha com um grupo de outros psicólogos. A primeira reunião com os profissionais de saúde mental de Nova Friburgo teve a participação de pouco mais de 20 pessoas. Na segunda reunião, esse número dobrou, o que demonstra a capacidade de multiplicação dessa estratégia. No total, mais de 130 participaram das nossas formações.

É comum MSF trabalhar na capacitação de profissionais? O trabalho da organização não é mais de atendimento direto ao público?
Cabral – O impacto que três psicólogas teriam se estivessem atendendo diretamente ao público é muito menor se com compararmos com a quantidade de pacientes que conseguimos atingir quando capacitamos mais 130 psicólogos. Esses profissionais podem multiplicar ainda mais esse conhecimento entre seus colegas e atingir um número ainda maior de pacientes. No contexto brasileiro onde a gente tem profissionais de muito boa qualidade e um número de voluntários grande, que dão uma resposta rápida, é importante que MSF aja dessa forma. Esse formato de atuação foi um pedido deles mesmos (profissionais e voluntários que estão trabalhando na Região Serrana).

Qual a grande lição desta missão?
Cabral – Uma lição que a gente teve é que, em geral, a capacidade de resposta a desastres como este no Brasil é muito grande, muito rápida. Mas é fundamental que os cuidados de saúde mental sejam integrados à resposta de emergência desde os primeiros dias.

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