Medidas coercivas impostas por Israel prejudicam os habitantes de Masafer Yatta

© Juan Carlos Tomasi/MSF

Os habitantes de Masafer Yatta e arredores, na Cisjordânia, Sul dos Territórios Palestinianos Ocupados, vivem em medo constante de despejo, veem as casas serem demolidas e têm as deslocações limitadas pelas medidas restritivas impostas por Israel.

Esses são alguns dos desafios expostos no novo relatório da Médicos Sem Fronteiras (MSF), intitulado The unbearable life: the health impacts of the Israeli measures to forcibly evict the residents of Masafer Yatta – nele, a organização médica-humanitária documenta como as autoridades israelitas exercem uma pressão extraordinária para levar as comunidades locais a abandonarem a área e os impactos que esta coerção tem na saúde física e mental das pessoas em Masafer Yatta.

“Se eu perder a minha terra, perco a minha vida”, frisa uma pessoa da aldeia de Al-Majaz, em Masafer Yatta, resumindo o que está em risco para as comunidades afetadas.

Para além da ameaça de expulsão das casas onde vivem, os residentes vivem sob constantes riscos de violência. “Os soldados entram nas aldeias à noite, impõem o recolher obrigatório e outras restrições de movimento, realizam treinos militares perto de áreas de habitação, confiscam veículos e demolem casas”, descreve o coordenador-geral da MSF nos Territórios Palestinianos Ocupados, David Cantero Pérez. “Tornam a vida dos habitantes insuportável”.

 

Mahmud e Safa, habitantes de Al- Markez, em Masafer Yatta, cuja casa foi demolida várias vezes, vivem atualmente numa gruta.
Mahmud e Safa, habitantes de Al- Markez, em Masafer Yatta, cuja casa foi demolida várias vezes, vivem atualmente numa gruta. © Juan Carlos Tomasi/MSF

 

As medidas impostas pelas autoridades israelitas tem vindo a intensificar-se desde maio de 2022, na sequência de uma decisão do Supremo Tribunal de Israel que removeu todas as barreiras legais à deslocação forçada de palestinianos de Masafer Yatta, para dar lugar a uma zona militar. Isto teve um grande impacto na capacidade de os residentes acederem a serviços básicos, incluindo cuidados médicos.

Este novo relatório da MSF revela que pacientes são frequentemente impedidos de se deslocarem a aldeias onde a MSF providencia assistência médica, caso os documentos de identificação mostrem que são oriundos de uma outra aldeia. Em outras ocasiões, ambulâncias que tentam chegar a Masafer Yatta são atrasadas ou mesmo bloqueadas e habitantes que tentam alcançar os hospitais são parados em postos de controlo, enfrentando longos atrasos.

Muitos habitantes contam que esta incerteza ligada ao acesso a cuidados médicos em Masafer Yatta tem forçado pessoas em situação de vulnerabilidade médica – incluindo grávidas no fim da gestação, pessoas idosas com condições crónicas de saúde e pessoas com doenças graves – a deixarem as casas e as famílias para trás e mudarem-se para Yatta, uma cidade nas proximidades.

As medidas coercivas fazem com que os habitantes de Masafer Yatta temam pela própria segurança e os pais e mães se sintam impotentes para proteger os filhos. Familiar de uma criança contou que esta tinha sido acordada durante a noite por um soldado armado e um cão que entraram no quarto. Outros familiares descreveram os sentimentos de desespero e impotência quando os filhos chegaram da escola e viram que a casa da família tinha sido demolida.

Viver nestas condições difíceis está a afetar gravemente a saúde mental das pessoas. As equipas móveis da MSF têm vindo a providenciar cuidados médicos, incluindo de saúde mental, à população de Masafer Yatta, desde 2021. O relatório da MSF destaca também que se regista um grande aumento na procura de serviços de saúde mental entre os residentes a quem foram feitas incursões em casa e demolições. Na sequência destes incidentes, em 2022, mais de metade dos pacientes da MSF deu conta de sintomas psicossomáticos; um quarto de sintomas pós-traumáticos; dois terços de sintomas depressivos.

Durante o último ano, testemunhámos em primeira mão os impactos do ambiente de crescente coerção na saúde física e mental das pessoas em Masafer Yatta,” explica David Cantero Pérez. “Enquanto organização médica-humanitária, denunciamos as políticas israelitas e instamos as autoridades do país a suspender imediatamente o plano de despejo e a parar de impor medidas que restringem o acesso a serviços básicos, incluindo a cuidados médicos, das pessoas palestinianas em Masafer Yatta. Este sofrimento desnecessário tem de parar”, urge ainda o coordenador-geral da MSF nos Territórios Palestinianos Ocupados.

Por fim, a MSF insta a comunidade internacional a tomar medidas urgentes e necessárias para proteger a população de Masafer Yatta e a garantir que os direitos humanos destas pessoas são respeitados.

 

Números e factos:

  • 1981: o ano em que Israel designou Masafer Yatta como uma zona de tiro do Exército pela primeira vez.
  • 1 144: o número de pessoas palestinianas que vivem em 12 comunidades de Masafer Yatta, incluindo 569 crianças.
  • Maio de 2022: Uma decisão do Supremo Tribunal de Israel removeu todas as barreiras legais que impediam a deslocação forçada de palestinianos de Masafer Yatta para estabelecer uma zona militar.
  • De maio a outubro de 2021, 20,7 por cento dos pacientes de saúde mental da MSF tiveram incursões em casa e 3,8% viram as propriedades ser demolidas. Estes números subiram para 39,8% e 21,8%, respetivamente, durante o mesmo período em 2022. Após o aumento dos incidentes, mais de metade destes doentes deu conta de sintomas psicossomáticos; um quarto apresentou sintomas pós-traumáticos; dois terços descreveram ter sintomas depressivos.
  • Comparando de maio a outubro de 2022 com o período homólogo de 2021, a MSF observou uma redução em 27 por cento no número total de consultas para doenças crónicas por cada clínica móvel. Avaliações de acompanhamento mostraram que a maior parte dos pacientes deixou de ir às consultas de seguimento devido a problemas relacionados com o acesso, como o facto de terem o carro confiscado pelo Exército israelita e a necessidade de passar mais tempo na cidade próxima de Yatta para ficar mais perto de estruturas médicas.
  • Em Masafer Yatta o abastecimento de água é regularmente cortado, os tanques de água são destruídos e os camiões que a transportam são parados no trajeto e confiscados. As dificuldades para conseguir água suficiente são agravadas pela falta de chuva. A escassez de água suscita preocupações com a saúde física da população.

 

A MSF providencia cuidados médicos e de saúde mental aos residentes de Masafer Yatta através de clínicas móveis, desde 2021, e cuidados de saúde mental no governorado Hebron, que inclui Masafer Yatta, desde 1996. Atualmente, as equipas da MSF testemunham o impacto das medidas coercivas de Israel em todos os aspetos da vida diária das pessoas residentes naquela zona.

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