MSF atua para minimizar efeitos das ondas de violência no Sudão do Sul

Conflitos entre comunidades obrigam milhares a fugir para mata e aumentam número de pacientes em hospitais

MSF atua para minimizar efeitos das ondas de violência no Sudão do Sul

As equipes de MSF atuam em duas frentes na maior parte dos países: buscam conter o avanço da COVID-19 e manter os serviços habituais de saúde para as doenças mais comuns em cada região. No Sudão do Sul, no entanto, os desafios são ainda maiores, por causa das ondas de violência e da época das chuvas, que dificultam ainda mais os deslocamentos, já restritos pelo novo coronavírus.

As regiões de Jonglei e Grande Pibor vivem ciclos repetidos de conflitos violentos entre as comunidades – alguns durando meses a fio ao longo de 2020. A escalada mais recente, de junho a meados de agosto, causou o deslocamento de milhares de pessoas. Muitos continuam a viver na mata sem as mínimas condições, já que faltam cuidados de saúde, abrigo, comida, água e saneamento.

“Esse conflito continua desde o ano passado. Surgiu novamente em fevereiro e depois em junho. Não é a primeira vez que temos tais confrontos intercomunitários e a violência insistente. No passado, era sobre roubo de gado. Agora, está afetando mais seriamente nossa comunidade. Estamos vendo a perda de propriedade, a perda de vidas. Perdemos nosso gado. Perdemos nossos filhos”, diz Sebit Burane, supervisor da equipe de enfermagem de MSF em Pibor.

Em nossa clínica em Pieri, as equipes trataram mais de cem feridos em apenas uma semana, de 29 de julho ao início de agosto. Em Pibor, onde retomamos as atividades em 11 de agosto, tratamos 11 pacientes com ferimentos por arma de fogo – o mais jovem com apenas três anos de idade.

“Perdi cinco membros da minha família. Depois que fui ferido, fui transportado em uma maca carregada por vários homens. Demoramos 11 dias para chegar a Pieri. Houve fortes chuvas que nos atrasaram”, afirma Peter, 43 anos de idade, residente em Modit, no estado de Jonglei.

São poucos os hospitais no Sudão do Sul com capacidade para administrar deslocamentos em massa de pessoas que requerem intervenções cirúrgicas críticas. Como resultado, dezenas de pacientes de Pieri foram transportados para realizarem cirurgias urgente no hospital de MSF no campo de Proteção de Civis de Bentiu (PoC), enquanto os feridos em Pibor, que precisam de tratamento complexo, foram encaminhados ao Ministério da Saúde e ao Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV), que administra o Hospital Militar de Juba.

“O número de pacientes era impressionante, colocando uma pressão significativa sobre nossas equipes médicas. Naquele momento, nosso hospital em Bentiu, para onde os pacientes mais graves eram encaminhados, já estava sobrecarregado devido ao pico de casos de malária”, informa Tila Muhammad, coordenador-geral de MSF no Sudão do Sul.

Nas últimas semanas, as fortes chuvas prejudicaram a capacidade de fazer esses encaminhamentos. Estradas de terra se tornaram intransitáveis e as pistas de pouso não asfaltadas, inutilizáveis, com aeronaves incapazes de pousar ou decolar. A já complexa situação é dificultada pelas restrições impostas pela COVID-19.

 

 MSF retoma atividades em Pibor

No dia 11 de agosto, quase dois meses após a suspensão das atividades devido às restrições direta e indiretamente relacionadas ao surto da COVID-19 e à violência generalizada, MSF deu início a uma resposta de emergência em Pibor. As atividades de atenção primária ambulatorial de emergência foram instaladas no centro da cidade.

“Estamos aliviados por finalmente fornecer cuidados de saúde primários, especialmente nesta época do ano que é a estação das chuvas e a ‘estação de escassez’ – quando sabemos que haverá altas taxas de desnutrição, doenças transmitidas pela água e malária”, avalia Josh Rosenstein, coordenador de Emergências de MSF em Pibor. “Ficamos preocupados ao ouvir depoimentos de nossos pacientes e de nossa equipe sobre o impacto que a violência dos últimos meses teve nas pessoas. As pessoas continuarão a enfrentar dificuldades por algum tempo, muitas perderam a família, suas casas, segurança socioeconômica, dignidade e precisam de cuidados básicos de saúde.”

Por meio de uma clínica móvel, operando fora do centro da cidade de Pibor, e da unidade de saúde de emergência, MSF já realizou mais de 1.500 consultas, distribuiu mosquiteiros e forneceu cuidados pré-natais para quase 300 mulheres grávidas.

“Temos vivido uma vida miserável. Tudo começou em fevereiro e nunca esperaríamos que essa situação durasse tanto. Corri para a mata com minha filha que tinha três meses de vida. Ela estava doente e morreu em julho. Hoje, é a primeira vez que tenho acesso a um posto de saúde desde fevereiro”, diz Marta, 19 anos de idade, residente em Pibor.

 

Confira uma linha do tempo da violência na região:

Ao longo de 2020, a região de Jonglei e Pibor experimentou níveis extraordinariamente altos de violência.

Fevereiro – a equipe de MSF em Pibor montou uma clínica de emergência em resposta ao grande número de deslocados e feridos que chegavam. 

Março – A clínica de MSF em Pieri recebeu 68 pacientes feridos em apenas 12 horas. Nessa mesma onda, tratamos 15 pessoas em Lankien e 45 feridos em Pibor.

Maio – o confronto chega a Pieri. Entre os mortos estava um membro da equipe de MSF. As autoridades locais estimam que 200 pessoas morreram no total e cerca de 300 ficaram feridas. A equipe de MSF foi evacuada e as operações foram suspensas por dois dias. 

JunhoMSF suspende as atividades na cidade de Pibor após confrontos localizados. Nossa capacidade de recomeçar é prejudicada pela violência contínua e pelas imensas restrições impostas pela COVID-19. 

Julho – Os conflitos continuam com as equipes de MSF em Pieri recebendo mais de 100 feridos em apenas uma semana, de 29 de julho ao início de agosto.

Agosto – MSF relança uma resposta de emergência na cidade de Pibor, em 11 de agosto, tratando 11 pacientes feridos por arma de fogo.

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