MSF insta a UE a reforçar o escrutínio da violência contra pessoas que procuram refúgio na Europa

A MSF repudia as práticas de violência usadas contra refugiados, requerentes de asilo e migrantes nas fronteiras europeias desde 2014

© Achilleas Zavallis, 2023

No seguimento de uma recente visita à fronteira entre a Sérvia e a Hungria por altos funcionários da União Europeia, a organização internacional médica-humanitária Médicos Sem Fronteiras (MSF) insta os estados europeus a reforçarem o escrutínio da violência contra pessoas refugiadas, migrantes e requerentes de asilo nas fronteiras europeias.

Desde janeiro de 2021, as equipas médicas da MSF a trabalhar nas regiões perto da fronteira entre a Sérvia e a Hungria forneceram tratamento para lesões traumáticas a 498 pessoas, incluindo contusões, hematomas e fraturas fechadas, após terem alegadamente enfrentado violência por parte das autoridades da fronteira.

“Os ferimentos que tratamos e os relatos de violência que ouvimos dos pacientes indiciam o uso intencional e continuado de violência para impedir as pessoas de procurarem asilo na UE”, sublinha o coordenador-geral do projeto da MSF nos Balcãs Ocidentais, Duccio Staderini.

Os pacientes da MSF que receberam tratamento perto das fronteiras relatam ter sido despojados das roupas e pertences, mas também agredidos com paus e tacos. Para além disso, contam que as autoridades utilizam, por vezes, cães para agredir as pessoas, assim como gás pimenta e lacrimogéneo.

Outras formas de tratamento desumano e degradante denunciadas por pacientes da MSF incluem a apreensão e destruição de pertences, detenções não oficiais em celas de confinamento solitário perto da fronteira, e quedas intencionalmente induzidas de vedações ou escadas.

A 16 de março, a Comissária da União Europeia com a pasta dos Assuntos Internos, Ylva Johansson, que também foi recentemente nomeada diretora da FRONTEX (agência responsável pela vigilância e proteção de fronteiras) visitou o ponto de passagem oficial da fronteira entre Horgos, na Sérvia, e Roszke, na Hungria. Este é um dos locais onde os guardas mais recorrem a práticas violentas para forçar os migrantes a retornar. Contudo, durante a visita, Johansson destacou o sucesso das operações comuns de controlo fronteiriço em diminuir a “imigração ilegal” para a Europa.

“Os representantes da União Europeia têm decidido fechar intencionalmente os olhos ao uso excessivo de violência, que já testemunhámos nas fronteiras externas da UE”, defende Staderini. “Esta visita mostra a verdadeira posição da UE no que diz respeito ao seu envolvimento nos Balcãs Ocidentais: aumentar o financiamento para a segurança, aumentar a presença da FRONTEX e aumentar a vigilância e os retornos de migrantes.”

Há dois anos, a FRONTEX suspendeu operações no lado húngaro da fronteira com a Sérvia, no seguimento de uma decisão judicial tomada contra a Hungria, por ter infringido o direito da União Europeia ao forçar ilegalmente migrantes vindos da Sérvia a voltar para trás. Assim, em dezembro de 2022, a FRONTEX deslocou as operações para o lado sérvio da fronteira, ao abrigo do projeto da UE para externalizar o controlo de migrações para países vizinhos terceiros.

As equipas da MSF trabalham na Sérvia desde 2014, prestando cuidados médicos a refugiados, migrantes e requerentes de asilo que viajam para a Europa através da rota dos Balcãs. Em janeiro de 2021, a MSF começou a desenvolver atividades na região Norte da fronteira entre a Sérvia e a Hungria e, em janeiro de 2023, a organização iniciou um projeto de emergência no Sul da fronteira.

Atravessar a fronteira da Bulgária para a Sérvia envolve caminhar durante três a quatro dias por florestas montanhosas. Durante a viagem, as pessoas não têm frequentemente acesso a comida, água ou abrigo e têm de enfrentar condições climatéricas difíceis. Em fevereiro passado, um adulto e uma criança morreram de frio durante a viagem. Este ano, as equipas da MSF em Pirot, uma vila que fica no lado sérvio da fronteira, providenciaram tratamento a 1 944 pessoas para queimaduras de frio, pé de trincheira (lesão provocada pela prolongada permanência dos pés em água fria), feridas infetadas, lesões e bolhas na pele e exaustão física.

A MSF repudia as práticas de violência usadas contra refugiados, requerentes de asilo e migrantes nas fronteiras europeias desde 2014.

“Os Estados-membros da União Europeia estão a continuar a dar prioridade à proteção de fronteiras em vez de protegerem as pessoas e assegurarem o seu bem-estar”, frisa Staderini. “E isso tem de acabar.”

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