Necessidade urgente de melhor acesso a novos tratamentos da tuberculose

O acesso a testes de diagnóstico é um dos principais desafios para permitir a prescrição dos regimes de tratamento mais curtos e seguros

MSF/Nargiz Koshoibekova, 2023

A Médicos Sem Fronteiras (MSF) insta os governos e doadores a acelerar o acesso a tratamentos novos, mais curtos, seguros e eficazes para a tuberculose resistente a medicamentos (TRM-TB), assim como aos testes de diagnóstico necessários para a concretização destes novos regimes de tratamento.

A organização médica-humanitária juntou-se à Organização Mundial da Saúde (OMS) e a outras entidades numa “Chamada à Ação” dias antes de se assinalar o Dia Mundial de Combate à Tuberculose, a 24 de março. A MSF urge também a empresa de diagnósticos Cepheid, com sede nos Estados Unidos, a baixar o preço dos críticos testes GeneXpert, para garantir que pessoas com TRM-TB possam ser diagnosticadas a tempo de acederem aos regimes de tratamento mais curtos e seguros.

A OMS emitiu novas diretivas em dezembro de 2022 a recomendar que os países instaurem o regime BPaLM – com a duração de seis meses e composto por bedaquilina, pretomanida, linezolida e moxifloxacina –, o qual é mais seguro e mais curto, para tratar pessoas com TRM-TB. Estas recomendações são em parte baseadas nos resultados do ensaio TB PRACTECAL, um ensaio clínico controlado e aleatório feito pela MSF que envolveu vários países e que mostrou que o novo tratamento BpaLM, de seis meses e totalmente oral, é mais seguro e mais eficaz para tratar a TRM-TB do que os regimes de tratamento atualmente usados, que são mais longos, causam efeitos secundários intoleráveis e só curam 60 por cento das pessoas com TRM-TB.

“Para mim, tudo nos últimos dois anos andou em torno da tuberculose”, frisa Maria*, que passou por dois longos anos de tratamento que tão pouco conseguiu curá-la da TRM-TB, e mais tarde recebeu o regime BPaLM na Bielorrússia. “Viver daquela forma era impossível. As pessoas [com o tratamento antigo] não podem fazer nada porque se sentem pessimamente durante o tratamento. Se eu tivesse começado logo o [novo] tratamento de curta duração, a minha vida teria sido diferente.”

O acesso a testes de diagnóstico para a resistência é um dos principais desafios para permitir a prescrição dos regimes de tratamento da TRM-TB que são mais seguros e mais curtos. Atualmente, o teste GeneXpert MTB/RIF, produzido pela empresa norte-americana Cepheid, é o teste de diagnóstico molecular rápido que está disponível de forma mais ampla nos países mais afetados e que deteta a resistência à rifampicina, o medicamento de primeira linha mais usado. Apesar dos grandes volumes de vendas em países com elevada incidência de tuberculose, e da análise da MSF mostrar que custa à Cepheid menos de cinco dólares (cerca de 4,64 euros) para produzir um teste, a empresa tem mantido o preço em 9,98 dólares (cerca de 9,26 euros) por teste durante já mais de uma década.

Os países deveriam começar a introduzir o regime BPaLM de seis meses para tratar a TRM-TB e assegurar a disponibilidade dos testes GeneXpert MTB/RIF com amplitude total em cada país, ou, onde seja possível, alternativas recomendadas pela OMS, como os testes Truenat MTB/RIF, para detetar a tuberculose e a resistência à rifampicina, de modo a que as pessoas com TRM-TB possam receber este tratamento sem demoras.

“É fundamental que tenhamos melhor acesso a testes para diagnosticar a tuberculose e a resistência aos medicamentos usados para tratar a TB, de forma a podermos identificar mais pessoas que precisam de tratamento e introduzir os regimes de tratamento mais curtos, seguros e totalmente orais”, sustenta o consultor de diagnósticos da Campanha de Acesso a Medicamentos da MSF, Stijn Deborggraeve. “Instamos uma vez mais a Cepheid a baixar o preço dos testes de tuberculose para não mais do que cinco dólares por teste, para que mais pessoas com TRM-TB possam ser diagnosticadas atempadamente e lhes sejam disponibilizados tratamentos melhores e que salvam vidas.”

O preço dos medicamentos também precisa de descer mais: para ajudar a que isso aconteça, os programas nacionais de tratamento da tuberculose devem aplicar estes novos regimes a mais pessoas, aumentando assim a procura, e deve haver mais fabricantes a fornecer versões genéricas e mais baratas de bedaquilina e de pretomanida.

O preço mais baixo praticado para este novo regime de tratamento da TRM-TB é ainda de 570 dólares (cerca de 524 euros). A MSF tem reiterado o pedido de que o preço de um ciclo completo de tratamento da TRM-TB, incluindo o regime BPaLM, não seja superior a 500 dólares (cerca de 460 euros). Cinco países onde a MSF trabalha começaram já a usar os regimes mais curtos: a Bielorrússia, o Uzbequistão, Tajiquistão, Serra Leoa e Paquistão. Maiores reduções nos preços vão permitir que este tratamento chegue a muitos mais países.

“Num país como o Afeganistão, onde as pessoas têm dificuldades para comprar produtos alimentares básicos, pagar custos de deslocação e despesas médicas nos hospitais, poder tratar pessoas com tuberculose resistente a medicamentos em seis meses, em vez de ser num período que pode ir até dois anos com os antigos regimes de tratamento, seria uma bênção” sublinha o coordenador médico da MSF no Afeganistão, Geke Huisman. “O acesso a testes de diagnóstico a preços acessíveis permanece um grande desafio no Afeganistão e noutros países da região, devido aos elevados preços praticados. Os governos, doadores e as empresas farmacêuticas têm de agir agora para assegurar um fornecimento acessível destes testes e tratamentos fundamentais para a tuberculose, de forma a que mais vidas possam ser salvas.”

 

* paciente identificada apenas pelo primeiro nome para proteção de identidade

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