Palavras de despedida de um projeto da MSF no Paquistão

Foram tratadas 11 000 pessoas nos serviços de urgência do Hospital da Sede do Distrito de Chaman, apoiados pela MSF desde 2007 – Sher Bahar Khan, enfermeiro na instalação, despede-se do projeto recordando momentos marcantes

Paquistão - Emergência
© Khaula Jamil

Dezasseis anos depois, a Médicos Sem Fronteiras (MSF) entregou às autoridades os serviços de urgência prestados no Hospital da Sede do Distrito em Chaman, uma cidade no Paquistão, próxima da fronteira com o Afeganistão.

Em 2007, foi preparada e estabelecida uma ala de emergência para garantir cuidados urgentes a pacientes com traumas ligados ao conflito e a influxos de grandes números de vítimas.

Só em 2023, esses serviços de urgência providenciaram tratamento a 11 000 pessoas. No entanto, desde 2011, a maioria dos casos de trauma recebidos são decorrentes de vários tipos de acidentes – como acidentes rodoviários – que podem ser tratados noutras instalações de saúde pública em Chaman.

 

Acreditamos que este é o momento certo para transferir a responsabilidade geral da gestão para a equipa do Ministério da Saúde.”

– Xu Weibing, coordenador de projeto da MSF

 

“Todos estes anos de apoio dedicados aos serviços de urgência do Hospital da Sede do Distrito e de uma estreita colaboração com a equipa do Ministério da Saúde resultaram em conquistas significativas”, expressa o coordenador do projeto da MSF, Xu Weibing. “Embora a MSF reconheça que a procura por serviços de saúde de emergência persista, também acreditamos que este é o momento certo para transferir a responsabilidade geral da gestão para a equipa do Ministério da Saúde.”

Xu Weibing garante, no entanto, que a MSF continua preparada “para ajudar as autoridades de saúde locais em caso de emergência” e que “continuará a fornecer formação de preparação para influxos de vítimas em massa em Chaman.”

 

Um trabalho que marca

Paquistão - Hospital
Serviços de urgência no hospital em Chaman. © MSF, 2024

Sher Bahar Khan é um enfermeiro que trabalhou nos serviços de urgência desde 2016. Ajudou a responder a vários tipos de situações, como “traumas resultantes de confrontos intercomunitários, queimaduras, bombas, acidentes rodoviários e tentativas de suicídio”, mas sublinha que também já receberam tratamento na ala alguns pacientes do Afeganistão.

 

Nós tratámos muitos pacientes e servimos a comunidade, e a comunidade confia em nós.”

– Sher Bahar Khan, enfermeiro na unidade desde 2016

 

“Lembro-me que, após um confronto entre as forças militares e grupos armados, 32 pacientes chegaram à unidade”, recorda. “Estava a fazer um curativo na perna de uma pessoa ferida, quando notei que um rapaz na sala me estava a fazer sinais com os olhos. Tinha as pernas e os braços gravemente feridos, e mal conseguia falar: ‘sou o único filho dos meus pais, por favor salve-me’, disse-me ele. Fiz o melhor que pude e encaminhei-o para Quetta [a 130 quilómetros de distância]. Dois meses depois, voltou à minha procura. Veio ter comigo, abraçou-me e disse: ‘salvou-me a vida’.”

“Nós tratámos muitos pacientes e servimos a comunidade, e a comunidade confia em nós. Em muitas ocasiões, trabalhamos turnos de 24 horas para responder a um influxo de grandes números de vítimas após confrontos violentos. Uma vez estabilizados, os pacientes eram prontamente levados para o hospital em Quetta”, frisa Sher.

“Uma noite, às 3 da manhã – eu era o único de plantão – foram trazidos sete pacientes do Afeganistão. Havia um homem com o corpo cheio de balas. Eu providenciei-lhe rapidamente os cuidados necessários e encaminhei-o para Quetta, e depois atendi a todas as outras pessoas feridas também”, lembra Sher Bahar.

 

Uma noite, às 3 da manhã – eu era o único de plantão – foram trazidos sete pacientes do Afeganistão. Havia um homem com o corpo cheio de balas.”

 

Sher confessa que é um desafio trabalhar com pacientes gravemente feridos, mas reconhece que, como profissional, tem de “aprender a lidar com isso”, mesmo nas situações mais complicadas: “Às vezes, 20 a 30 homens armados apareciam com o paciente e queriam interferir no tratamento. O que achei difícil foi ser apanhado no meio de um conflito.”

A MSF é uma das maiores prestadoras de cuidados de saúde no Baluchistão e continua comprometida a fornecer serviços de saúde sem custos e de qualidade. Em colaboração com o Ministério da Saúde, as equipas médicas da MSF continuarão a fornecer um série de cuidados no hospital da Sede do Distrito em Chaman, incluindo numa sala de partos que funciona 24 horas por dia, numa enfermaria de internamento pediátrico, numa unidade neonatal e através de programas de alimentação terapêutica para crianças desnutridas com menos de cinco anos.

Partilhar