Três perguntas sobre os recentes confrontos violentos em Port au Prince

Na última semana, Port au Prince tem sido assolada por confrontos violentos, que chegaram até aos bairros mais calmos da cidade. O coordenador-geral da Médicos Sem Fronteiras (MSF) no Haiti, Mumuza Muhindo, explica como a violência tem afetado as pessoas

© Pierre Fromentin/MSF

Quando é que esta vaga de violência começou?

Desde a manhã de domingo 24 de abril, vários bairros da capital têm sido palco de confrontos violentos entre grupos armados. Nestes locais as condições de vida das pessoas, que se encontram cercadas pela violência, são já geralmente muito difíceis.

Os confrontos continuam a intensificar-se e expandiram-se para outras áreas de Port au Prince que são habitualmente muito calmas. Alguns profissionais da MSF estão também encurralados em diferentes partes da cidade devido à violência, sem conseguirem deslocar-se para trabalhar. Ninguém se atreve a percorrer estas estradas: agora há barricadas ao longo de todas as estradas principais, onde quase já não há veículos a circular – só restam cães abandonados.

Quais são as consequências para a população?

Algumas pessoas fogem de casa e procuram refugiar-se com familiares. Para muitas delas, não é a primeira vez que isto acontece. A violência é recorrente e causa sempre novas deslocações. Os mais necessitados passaram a noite em abrigos improvisados, montados numa praça pública não muito longe de onde decorrem os confrontos.

Para quem fica, nem sempre é possível abandonar as habitações, já que há tiroteios nas imediações das casas. Um dos nossos colegas teve de passar a noite deitado no chão em casa, para se proteger das balas perdidas.

As pessoas nem sequer podem sair para fazer compras, uma vez que até os mercados se tornaram em locais de combate onde as pessoas correm risco de vida.

É possível manter o acesso a cuidados de saúde?

Estamos muito preocupados, porque o nosso hospital em Tabarre, com 70 camas e especializado em cuidados de traumatologia e queimaduras, está quase totalmente ocupado e a insegurança está a tornar-se novamente num verdadeiro obstáculo para a obtenção de cuidados. As ambulâncias já não conseguem entrar em certos bairros para prestar atendimento aos feridos, o que significa que as pessoas podem ter de esperar vários dias para receber cuidados.

Para além disso, pacientes que necessitam de tratamento não conseguem chegar às unidades de saúde, porque as estradas estão bloqueadas. Desde domingo, tem-se registado uma redução no número de consultas ambulatórias no hospital em Tabarre.

A Médicos Sem Fronteiras continua a prestar apoio às pessoas que estão em Port au Prince e a fornecer os cuidados médicos de que necessitam. Tal como em todos os conflitos armados, a organização sublinha que os civis têm de ser poupados e que deve ser garantido a todas as pessoas o acesso a cuidados médicos.

 

A Médicos Sem Fronteiras trabalha no Haiti desde 1991. Providencia apoio a comunidades em dificuldades, vítimas de catástrofres naturais ou de origem humana, e a vítimas de guerra. A organização trabalha em total independência de quaisquer poderes políticos ou militares. Em 2021, 22 758 pessoas foram admitidas em serviços de urgências da MSF no Haiti. As equipas da organização forneceram cuidados a 15 435 pessoas com casos de traumatologia e 833 pessoas com queimaduras. Perto de 1 600 sobreviventes de violência sexual e de género receberam tratamento. Um total de 12 803 consultas de cuidados primários foram prestadas pelos serviços ambulatórios da MSF.

Partilhar