Ucrânia: pacientes com patologias psiquiátricas e neurológicas transferidos de hospital sobrelotado em Kharkiv

Fornecer cuidados aos pacientes de forma continuada tornou-se num desafio imenso para as instalações de saúde e instituições de cuidados nas nas áreas de combates ativos na Ucrânia. Por isso, a MSF prestou apoio na transferência de cerca de 200 pacientes para hospitais longe dos combates

Ucrânia: pacientes com patologias psiquiátricas e neurológicas transferidos de hospital sobrelotado em Kharkiv
© MSF/Hussein Amri, 2022

Foram transferidos mais de 200 pacientes com doenças neurológicas e psiquiátricas de um hospital sobrelotado na cidade de Kharkiv, no Leste da Ucrânia, para várias instalações de saúde em Kiev, através do comboio médico da Médicos Sem Fronteiras (MSF). Neste hospital, os pacientes enfrentavam condições extremamente desafiantes, nomeadamente no acesso a cuidados médicos e a higiene adequada. Por vezes, alguns não tinham mesmo outra alternativa senão dormir no chão.

Providenciar cuidados aos pacientes de forma continuada tornou-se num desafio imenso para as instalações de saúde e instituições de cuidados nas nas áreas de combates ativos no Leste e Sudeste da Ucrânia. Para muitas, os fornecimentos de água e de eletricidade foram cortados; outras tantas simplesmente não conseguem dar resposta a necessidades essenciais, como a alimentação, e têm dificuldades acrescidas na obtenção da medicação de que os pacientes precisam. Tudo isto soma-se ao perigo extremo e constante dos combates perto das instalações.

O enfermeiro da MSF Denys Babiy descreve a alimentação de pacientes a bordo do comboio: “Trabalhei numa carruagem onde tínhamos nove pacientes acamados. Quando os alimentava, pediam-me dois pratos. As pessoas tinham fome, e até conseguíamos ver-lhes os ossos e as costelas. Parecia que estavam desnutridas há já algum tempo. Foi algo difícil de ver.”

No início de setembro, os pacientes encontravam-se numa instalação médica em plena zona de combate ativo em Kharkiv. O processo de transferência já estava em curso quando a instalação foi bombardeada, causando a morte de dois pacientes e quatro profissionais médicos. Mais tarde, os sobreviventes foram transferidos para um hospital na cidade de Kharkiv, cujo número de pacientes aumentou de 400 para mais de 1 000, no total.

“Após receber tantos pacientes, as condições no hospital ficaram muito difíceis, apesar do esforço redobrado das equipas médicas. Não havia camas, medicamentos ou profissionais suficientes para cuidar de todos”, explica o médico da MSF Borys Potapov, que acompanhou os pacientes de Kharkiv até Kiev.

O Ministério da Saúde pediu apoio à Médicos Sem Fronteiras para reduzir a sobrecarga deste hospital e transferir mais de 200 pacientes para outras instalações na cidade de Kiev. O Ministério da Saúde selecionou os pacientes a ser transferidos e informou a MSF do seu estado médico, mas não da sua origem. Antes de organizar o encaminhamento médico, a organização forneceu artigos de higiene pessoal ao hospital: sabão, champô, entre outros.

Os pacientes foram transportados em autocarros e numa ambulância do Ministério da Saúde até à estação de comboios de Kharkiv, onde embarcaram no comboio médico da Médicos Sem Fronteiras. O comboio partiu no dia 23 de setembro com uma equipa de profissionais da organização, apoiada por enfermeiros e um psiquiatra do Ministério da Saúde para prestar assistência aos pacientes durante a viagem.

“Fizemos duas viagens em 36 horas e transportámos pacientes com várias patologias. Alguns eram pessoas mais idosas com doenças neurológicas, como a de Parkinson ou de Alzheimer. Também tivemos muitos pacientes com transtornos psicóticos agudos, especialmente hoje durante a última viagem”, sublinha a coordenadora do projeto da MSF, Emilie Fourrey, falando da plataforma da estação em Kiev.

“Alguns dos pacientes estavam, compreensivamente, bastante agitados, mas tudo decorreu de forma tranquila durante a viagem para Kiev. Os pacientes serão transferidos para duas instalações distintas aqui, onde a MSF acompanhará a evolução do seu estado médico.”

A Médicos Sem Fronteiras fornece um serviço de transferência por ambulâncias a partir de 11 hospitais, perto de áreas de combate ativo no Leste e Sudeste da Ucrânia. Nas primeiras três semanas de setembro, foram transferidos 277 pacientes para unidades médicas ligeiramente mais afastadas dos combates. A maioria destas pessoas tinha sido vítima de traumas violentos, mas foi possível providenciar-lhes cuidados médicos adequados.

No entanto, tal como muitos pacientes com transtornos psiquiátricos e neurológicos o experienciaram, não há garantias de que as pessoas receberão cuidados adequados depois de serem transferidas para hospitais mais longe das zonas de combate – especialmente, se tiverem necessidades de saúde crónicas e complexas. Mesmo assim, transferir pacientes para hospitais no Oeste do país, afastados dos combates, pode aliviar a pressão de algumas instalações de saúde.

A 27 de setembro, a Médicos Sem Fronteiras visitou alguns dos pacientes que tinham sido encaminhados para um hospital psiquiátrico no oblast de Kiev. Um profissional do Ministério da Saúde transmitiu à equipa da MSF que alguns dos pacientes agradeciam por estarem agora num ambiente muito melhor do que nos hospitais perto dos combates. Mas apesar disto, continuavam com necessidades de saúde significantes – uma enfermeira sublinha que a equipa, experiente e com muitos anos de serviço, nunca tinha recebido pacientes num estado físico e mental tão frágil.

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