Começo de ano e despedidas

Parte 8 – Guidam Roumdji, 9 de janeiro de 2012

Tempo é uma coisa engraçada. Estamos sempre pensando nas coisas que devemos ou queremos fazer, ou pensando nisto ou naquilo que aconteceu há certo tempo e, quando nos damos conta, ele já passou por nós, deixando lembranças e aprendizado.

Já faz sete meses que estou no Níger, inacreditável, quando cheguei parecia que os nove meses não sairiam nunca dos nove dias, passei por várias situações novas, uma cultura completamente diferente e, problemas, que jamais pensei que teria que enfrentar. Mas, felizmente, para esta missão no Níger, eles enviaram dois pediatras e, todas essas coisas pelas quais passei, eu dividi com a Hannah.

Ela chegou duas semanas antes de mim, para uma missão de oito meses, também em sua primeira missão MSF, apesar de já ter feito estágios de pediatria no Quênia e na Tanzânia. Seu francês era tão ruim quanto o meu, enfrentamos as mesmas dificuldades: a língua, descobrir como funciona a vida dentro de MSF, um novo país onde duas mulheres brancas e jovens não são nem um pouco bem aceitas.

Tínhamos funções diferentes mas ajudamos uma a outra, eu aprendi muito com sua experiência em UTI e recém-nascidos. Dividimos frustrações quando víamos crianças morrer todos os dias na época do pico da malária e dividimos trabalho quando tínhamos três crianças por leito internadas.

Felizmente, também demos muita risada, dançamos, trocamos nossas experiências pessoais, fotos, filmes, músicas, cozinhamos. Foi super importante na minha primeira missão ter uma companheira como ela. Ficamos super próximas, o tempo passou super rápido, ela completou seus oito meses de missão e partiu hoje de manhã.

Sabia que seria triste, mas não pensei que fosse sentir tanto, chorei um monte esta manhã. E foi super fofo, porque, ontem ela pediu para o nosso cozinheiro ir ao mercado (não podemos ir, por causa das questões de segurança que não estão as melhores nas últimas semanas) e comprar algumas coisas para levar de lembrança. Entre elas, o que chamamos de “gri-gri”, um colarzinho que as mães colocam nas crianças como amuletos.

Depois que ela foi embora, encontrei na porta do meu quarto um gri-gri, com um raminho das flores do nosso jardim que adoro e com um sabonete que sua mãe fez, enrolado num jornal com um mapa da Alemanha, onde ela assinalou Munique e Berlim, a cidade dos seus pais e onde ela mora atualmente, respectivamente, com um recadinho que sempre terá uma porta aberta.

Não preciso nem dizer que me acabei de chorar quando encontrei isso. Enfim, vou sentir muito a falta dela. O pior é que serei a última do grupo inicial a ir embora.

Vou contar um pouquinho de como passamos o Ano Novo, para falar de coisas boas. Trabalhei sábado dia 31 até às 14 horas, como de costume, e passei o resto da tarde cozinhando. Fiz um bolo de nozes e coco com os ingredientes que minha mãe mandou, fiz brigadeiro e beijinho também.

Vieram a enfermeira responsável pelo Crenas (Débora) e o chefe de missão de Dakoro, o outro projeto de MSF aqui no Niger (fica a duas horas de Guidam) e, como ela acabou de chegar de férias, trouxe champagne. Um luxo tomar champagne no reveillon!!! Fizemos peixe e atiquê, uma comida típica da Costa do Marfim, a base de farinha de mandioca, deliciosa.

Depois dançamos até a meia-noite, mas devo confessar que dado o cansaço de todo mundo, antes da meia-noite já tava todo mundo meio capenga,mas foi gostoso.

A semana passou super rápido com o trabalho de sempre no hospital e a Hannah arrumando suas coisas para partir. Também fizemos a minha avaliação e fiquei feliz porque elas acham que depois que comecei meu trabalho com a formação dos enfermeiros, a qualidade do serviço melhorou bastante, principalmente no diagnóstico de Tuberculose e VIH.

Ontem eu e a Hannah fomos ao hospital para fazermos mais algumas fotos, e pedimos para uma mãe se ela podia nos ensinar a colocar seu bebê nas costas como as mães fazem por aqui, ela ficou super feliz e nos deu o bebê.

Depois, todas as mamães vieram com os bebês, eu coloquei um bebê nas costas e a Hannah colocou outro, demos muitas risadas e as mães também. Foi um momento super gostoso. Fizemos fotos lindas. Acho que foi uma despedida muito especial para a Hannah, junto com as crianças que adoramos.

Enfim, foi uma semana puxada e eu estou cansada e triste.

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