Consequências de um conflito na República Centro-Africana

Arquiteta brasileira dá continuidade ao relato de sua experiência na expansão de hospital apoiado por MSF na RCA

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03/10/2015 – Os últimos dias foram de extrema tensão na capital da República Centro-Africana (RCA), Bangui. A morte de um motorista muçulmano foi o estopim para uma onda de violência, que, por fim, teve como alvo, mas não exclusivamente, várias ONGs que trabalham na cidade. Por motivos de segurança, MSF e outras organizações foram obrigadas a deslocar seus profissionais para fora do país, em sua maioria através do rio, em direção à República Democrática do Congo (RDC).

Aqui em Bangassou a situação continua calma. Todo dia, acompanhamos com apreensão os relatórios de segurança, preocupados com a evolução dos ataques, mas também com a segurança das pessoas que pude conhecer em minha passagem rápida por Bangui e com o futuro do projeto no país.

Mas quais as consequências de uma série de ataques a oito horas de distância para uma cidadezinha pacata no interior do país? Em primeiro lugar, sempre existe a possibilidade de simpatizantes de ambos os lados iniciarem ataques por todo o país. Nesse caso, Bangassou continua como uma área de convivência pacífica. A outra questão, e que no momento nos atinge diretamente, é a falta de abastecimento. As lojas e os bancos de Bangui não estão funcionando, o acesso ao aeroporto está bloqueado e os voos foram todos cancelados. Como o acesso por estrada é difícil e perigoso, a maior parte do nosso fornecimento chega por ar. Ou seja, o envio de medicamentos, equipamentos e comida, o transporte de pacientes em condições mais complexas, o envio de amostras para exames específicos em laboratório, entre outros, está interrompido e sem previsão de retorno.

Como ainda estou na parte de planejamento do projeto de ampliação do hospital, continuo evoluindo nos projetos dos edifícios e no orçamento total, porém, um outro colega, responsável pela reforma e construção de três centros de saúde nos arredores de Bangassou, precisou parar os trabalhos pela falta de dinheiro em espécie para pagar os serviços contratados. Aqui não existem transferências bancárias e o dinheiro existente precisa ser conservado para outros pagamentos mais urgentes.

Enfim, uma situação de grandes incertezas sobre o nosso futuro aqui. Eu não consigo parar de pensar em todo o atendimento prestado aos pacientes, toda a equipe nacional que trabalha em diversas funções conosco, desde motoristas, vigias, logísticos e até enfermeiros e médicos. Fora todas as pessoas que me olham andando pelo hospital com o projeto embaixo do braço e me param para perguntar como anda, quantos prédios novos serão construídos. É incrível como eles pedem para ver os desenhos e, mesmo sem entender muita coisa do que está no papel, sorriem ao ver que o hospital deles pode ter um futuro realmente melhor. Obras de médio e grande portes, normalmente, são fontes de emprego para muitas pessoas locais, já que muitos serviços não demandam mão de obra especializada. 

Enfim, no momento, nos resta continuar nosso trabalho da melhor maneira possível e aguardar os próximos acontecimentos.

Beijos,

Vivi

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