Fazer os pacientes sentirem-se seguros no hospital, “como se estivessem em casa”

Na cidade da Beira, em Moçambique, profissionais orientam e acompanham pacientes em exames e serviços médicos

Moçambique, Beira - Tanisha CAPA
© MSF

Estar num hospital pela primeira vez, por qualquer motivo, pode ser uma experiência assustadora. Os corredores e as salas da instalação podem ser intimidantes e, muitas vezes, é difícil descobrir onde estão os serviços necessários. É nestas alturas que pessoas como Tinasha Bento desempenham um importante papel.

É discreta e tem uma voz com efeito calmante, perfeita para aquilo que faz: é oficial de apoio ao paciente, ou “guia”, como é chamada pelos colegas da Médicos Sem Fronteiras (MSF) no movimentado Centro de Saúde de Munhava, na cidade portuária da Beira, em Moçambique.

Filas de pessoas formam-se no salão da receção, e os pacientes sentam-se em bancos à espera de serem chamados. Tinasha trabalha no local como guia, orientando as jornadas dos pacientes dentro do centro de saúde desde 2018. Conhece quase todos os cantos da instalação: talvez seja por isso que alguns dos colegas a chamem “guia turística do hospital”.

Tinasha auxilia os pacientes com o que precisam e direciona-os para os locais, consultórios, salas ou laboratórios corretos para consultas, testes de VIH e tuberculose, recolha de resultados de análises, aconselhamento e tratamento.

Moçambique, Beira - Tanisha
Tinasha é conhecida como “guia turística” do hospital. ©MSF

 

O que é apoio ao paciente?

“Quando um paciente chega, é fundamental que seja acompanhado e tenha todo o apoio que precisa”, explica Tinasha. “Chego até a acompanhar os pacientes à casa de banho, para garantir que ficam confortáveis, não se perdem e fazem os exames”.

“Algumas pessoas até se podem questionar: és uma babysitter? Não sou. O meu trabalho é garantir que os pacientes são bem atendidos e que permanecem no centro do nosso trabalho”, frisa. “Com uma doença como o VIH/Sida, que implica um tratamento a longo prazo, alguns pacientes podem sentir-se desmotivados e podem querer desistir. O meu trabalho é motivá-los a obter o tratamento que precisam. O meu apoio é muito importante.”

 

Pacientes no centro das atividades

Em 2018, a MSF e o Ministério da Saúde de Moçambique abriram um Balcão Único para o VIH em fase avançada no Centro de Saúde de Munhava, para fornecer serviços como exames, aconselhamento, análise de resultados de testes de laboratório e tratamento. Tinasha apoia os pacientes para receberem cuidados no centro de saúde com dignidade – já ajudou mais de 500 pessoas e lembra-se da maioria.

“Lembro-me muito bem de um paciente que veio em 2020 com VIH em fase avançada e não conseguia andar devido à doença. Estava acompanhado pela mulher, e eu ajudei-os a orientarem-se pelo hospital nos diferentes serviços que precisavam. Estive com ele e apoiei-o por cerca de dois anos. Em 2022, recuperou e voltou a andar. Este é um paciente que nunca esquecerei, porque vi o progresso desde a primeira vez que o ajudei até ao momento em que ele finalmente melhorou”, recorda Tinasha.

Moçambique, Beira - Tinasha 2
Tinasha recebeu formação especial para auxiliar pacientes no centro de saúde. © MSF

 

Sinto-me muito especial quando sou acompanhada por um oficial de apoio ao paciente.”-  Paciente acompanhada pela equipa da MSF em 2021.

 

A importância e o valor do apoio ao paciente podem ser atestados por uma mulher de 46 anos que vive com VIH: “Vi os benefícios do apoio ao paciente aqui em Munhava. A primeira vez que vim ao hospital, em setembro de 2021, estava muito doente. Eu não sabia o que tinha, então a equipa médica testou-me para tuberculose e VIH, e os resultados deram positivo. A minha contagem de CD4* era muito baixa, quase 46, e pesava apenas 36 quilos. Durante tudo isso, a equipa de apoio ao paciente ficou ao meu lado”, conta a mulher, que preferiu não ser identificada.

“A partir daí, comecei a receber tratamento. Sinto-me muito especial quando sou acompanhada por um oficial de apoio ao paciente. Não tenho dificuldades, não espero muito tempo na fila do laboratório e tudo é feito rapidamente. O apoio que recebo é enorme. A equipa ajudou-me a entender como devia tomar os meus medicamentos e a evitar falhar na medicação. Fico grata por isso.”

 

Não há nada tão gratificante como saber que contribuí para salvar uma vida.” – Tinasha Bento, oficial de apoio ao paciente.

 

O que mantém Tinasha inspirada é saber que o trabalho que desempenha é fundamental para os cuidados que um paciente recebe em Munhava.

“Já vi muitas pessoas chegar ao hospital em mau estado e já vi essas mesmas pessoas a recuperar e a receber alta: a maioria tem passado por mim. Não há nada tão gratificante como saber que contribui para salvar uma vida”, sublinha Tinasha. “Agora, se vir ou ouvir o nome de alguém, posso colocar um rosto nesse nome: é o quanto eu valorizo os pacientes. Há muitas pessoas que admiram a minha capacidade de memorizar os nomes e reconhecê-los quando vêm para o check-up e outros serviços. Tudo vem do apoio ao paciente.”

 

MSF na Beira

Na Beira, a MSF mantém um programa que fornece cuidados de saúde sexual e reprodutiva, incluindo atendimento ao aborto seguro e testes e tratamento para o VIH, a adolescentes em situação de vulnerabilidade e grupos estigmatizados, como profissionais do sexo e homens que fazem sexo com homens. Além disso, a MSF presta atendimento a pacientes com VIH em fase avançada em unidades de saúde na cidade. Em 2018, a MSF implementou diagnósticos e tratamentos precoces para melhorar a qualidade da gestão de infecções oportunistas em pacientes com VIH em fase avançada, no departamento de emergência do Hospital Central de Beira. Em 2021, o projeto estendeu-se para 10 centros de saúde na Beira, fornecendo orientação aos funcionários do Ministério da Saúde nos principais centros de saúde. Em 2022, Moçambique tinha cerca de 2,4 milhões de pessoas a viver com VIH e uma taxa de prevalência de cerca de 11.6 por cento, de acordo com a ONU. Moçambique é um dos países com maior prevalência de VIH no mundo.

 

 *A contagem de CD4 é um teste que mede o número de células CD4 presentes no sangue de alguém. São um tipo de glóbulos brancos que encontram e destroem bactérias, vírus e outros germes. Os resultados ajudam os profissionais de saúde a saber o dano causado ao sistema imunológico de alguém, e o que provavelmente acontecerá a seguir se o paciente não começar a tomar o tratamento antirretroviral. Todas as pessoas com VIH devem tomar antirretrovirais, independentemente de contagem de CD4.

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