Leste de Aleppo: médicos sitiados

Com a crescente escassez de medicamentos, suprimentos médicos e equipamentos, profissionais de saúde enfrentam desafios inimagináveis para oferecer cuidados essenciais de saúde à população

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Os médicos do leste de Aleppo estão trabalhando em circunstâncias extremamente difíceis, o que inclui a falta de profissionais de saúde, combustível, medicamentos e suprimentos médicos.

Enquanto esses médicos tratavam pacientes feridos, os hospitais em que trabalhavam foram atingidos por ataques aéreos. Cada um dos oito hospitais em funcionamento antes do cerco foi atingido, alguns deles repetidas vezes, o que totalizou 27 ataques a hospitais em apenas quatro meses. Em quase todos os casos, porém, os destroços foram removidos e as instalações foram reparadas e reabriram suas portas em questão de poucos dias.

Os desafios de trabalhar em meio ao cerco são enormes, mas, mesmo sob intensos bombardeios, os profissionais de saúde do leste de Aleppo encontraram meios de manter hospitais abertos e oferecer cuidados médicos aos pacientes necessitados.

Poucos medicos
Não há mais que 32 médicos na região leste de Aleppo, cuja população estimada é de 250 mil pessoas. Em resposta a essa situação, os médicos frequentemente fazem turnos em múltiplos hospitais e centros de saúde, de modo que seus conhecimentos específicos – como pediatria, obstetrícia ou cirurgia – estejam disponíveis ao maior número possível de pacientes.

Médicos assistentes que estão chegando ao fim de seus treinamentos também contribuíram para um aumento do número de profissionais nos hospitais. Alguns médicos nos contaram que quando um bombardeio massivo faz um grande número de feridos chegar ao hospital de uma só vez, todos os que estão no hospital ajudam, inclusive cuidadores e profissionais de limpeza.

Nas últimas três semanas, os ataques aéreos cessaram, dando aos profissionais a chance de se recuperarem depois de um período intenso, no qual mais de 2.000 pessoas foram feridas e quase 500 morreram, e de se prepararem para qualquer período futuro de intensos confrontos, ataques aéreos ou bombardeios indiscriminados. “Agora, os médicos exaustos estão aproveitando a oportunidade para ter um descanso”, diz Patricia Garcia Peinado, coordenadora de projeto da organização humanitária internacional Médicos Sem Fronteiras (MSF).

Enquanto isso, as equipes médicas do leste de Aleppo continuam oferecendo a melhor assistência possível em uma das circunstâncias mais difíceis que se pode imaginar.

Medicamentos chegando ao fim
Estoques de medicamentos e outros suprimentos médicos estão acabando. Nos meses anteriores ao cerco, administradores de hospitais armazenaram suprimentos, medicamentos e outros itens essenciais com a ajuda de várias organizações, incluindo MSF, que vem mandando entregas de suprimentos para o leste de Aleppo a cada três meses nos últimos dois anos.

Em abril deste ano, algumas organizações internacionais realizaram uma entrega de emergência em caso de um possível cerco. “Isso incluía medicamentos essenciais, como antibióticos e analgésicos”, diz Sara Ferrer, coordenadora médica de MSF, “mas também enviamos instrumentos médicos complexos; equipamentos essenciais, como ventiladores e incubadoras e equipamentos logísticos, incluindo geradores para manter a eletricidade funcionando em momentos de corte de energia.”  

Durante um curto período de agosto, quando o cerco foi rompido, MSF enviou 128 toneladas de suprimentos para os hospitais do leste de Aleppo, o que seria suficiente para durar até outubro. “Seis dos caminhões tiveram que retornar porque os bombardeios voltaram a acontecer, mas 85% dos suprimentos chegaram à cidade”, diz Eduardo Yanez, coordenador logístico de MSF. “Os hospitais estão usando esses estoques até agora – porém, eles devem estar chegando ao fim”.

Esses suprimentos provavelmente se esgotaram mais rápido que o normal devido aos grandes números de pacientes feridos. Além disso, por mais cuidadosos que os hospitais sejam no racionamento de medicamentos e outros suprimentos médicos, eles não duram para sempre. Atualmente, não há medicamentos para tratar câncer, tuberculose e hepatite, e há relatos de que muitos outros devem se esgotar em breve.  

“Estamos à beira do fim dos nossos últimos suprimentos e, uma vez que isso acontecer, enfrentaremos uma escassez médica aguda, especialmente em relação a medicamentos para doenças crônicas,” diz Mahmoud Abu Hozaifa, gerente de uma farmácia do leste de Aleppo. “Mas até mesmo conseguir analgésicos é um desafio.”

Os hospitais precisam ser reabastecidos urgentemente. Assim que for possível e as condições de segurança permitirem, MSF está pronta para enviar mais ajuda. “Já dispomos de medicamentos suficientes para abastecer 12 instalações médicas no leste de Aleppo – oito hospitais e quatro centros de saúde”, diz Eduardo Yanez, cuja equipe está de prontidão.

Menos leitos no subsolo
Hospitais foram forçados a se mudar para o subsolo a fim de proteger pacientes e equipes de ataques aéreos. Com os pisos superiores dos prédios dos hospitais abandonados, e com salas de emergência, centros cirúrgicos e centro de terapia intensiva deslocados para o subsolo, houve uma redução significativa no número de leitos disponíveis para os pacientes.

Equipes dos hospitais lidaram com a situação priorizando os casos mais urgentes e providenciando camas em casas próximas para os que precisavam de cuidados pós-operatórios. Os pacientes, entretanto, estão optando por passar o menor período de tempo possível nos hospitais. “Algumas mulheres passam por cesáreas e vão embora depois de poucas horas”, diz Sara Ferrer Roura. Muitas pessoas preferem ir aos centros de saúde locais, que são mais perto de suas casas e foram atingidos menos vezes por ataques aéreos.

Escassez de combustível
O leste de Aleppo está sem eletricidade há meses, e os hospitais dependem de geradores para obter energia e manter equipamentos essenciais como máquinas vitais e ventiladores em funcionamento. Porém, os geradores dependem de combustível, que é muito difícil de obter na área sitiada.

Em resposta a essa situação, equipes dos hospitais estão economizando cuidadosamente o combustível que usam, mantendo os geradores ligados por poucas horas a cada dia, ou recorrendo a eles apenas quando é urgentemente necessário. “Eles só usam os geradores quando realmente precisam deles, de modo que economizam combustível”, diz Patricia Garcia Peinado. “As equipes são incrivelmente adaptáveis e estão aprendendo a trabalhar em meio ao cerco.”

Antes do cerco, MSF oferecia medicamentos, suprimentos médicos e equipamentos a cada três meses a oito hospitais, seis centros de saúde, oito postos de primeiros socorros, um banco de doação de sangue e um serviço de ambulância no leste de Aleppo. Desde agosto, não foi possível realizar nenhuma entrega de suprimentos.
 

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