MSF suspende atividades médicas no Sudoeste dos Camarões

A organização urge pela libertação de quatro profissionais, injustamente detidos

© Faith Toran/MSF

A Médicos Sem Fronteiras anunciou a suspensão das atividades médicas e humanitárias no Sudoeste dos Camarões, a 5 de abril, três meses após a detenção de quatro profissionais, membros das equipas da organização no país. Após todo este tempo, ainda não se verificaram desenvolvimentos significativos neste processo. Por isso, e desde 29 de março passado, a MSF suspendeu as atividades no Sudoeste para se dedicar exclusivamente à libertação dos colegas detidos.

A 27 de dezembro de 2021, dois profissionais da MSF foram detidos, quando a ambulância onde transportavam um paciente com ferimentos de bala, e o qual necessitava urgentemente de assistência, foi parada num posto de controlo em Nguti (no Sudoeste do país). Apesar de terem cumprido os procedimentos de notificação humanitária acordados com as autoridades, estes trabalhadores da MSF foram detidos e estão agora a aguardar julgamento numa prisão em Buea. Estão a ser investigados por cumplicidade com secessionismo, apenas por cumprirem as suas funções médicas.

Nas semanas seguintes, dois outros colegas e colaboradores da MSF foram também detidos pela polícia dos Camarões. Encontram-se a receber aconselhamento jurídico e a organização médico-humanitária está em comunicação constante com eles e as suas famílias.

Para facilitar a libertação destes profissionais, representantes da Médicos Sem Fronteiras recorreram aos procedimentos legais, e também entraram em contacto com as autoridades camaronesas e outros intervenientes relevantes, a vários níveis, a fim de prestar informações e clarificar as atividades médicas e procedimentos da organização. Mesmo assim, ainda não foram registados progressos significativos. Além disso, em fevereiro, uma organização camaronesa independente concluiu num relatório sobre as detenções, solicitado pelo Ministério da Defesa do país, que a MSF e estes profissionais deviam ser exonerados de quaisquer delitos, e que a organização agiu em conformidade com os princípios humanitários, pelo que os detidos deviam ser libertos imediatamente.

“Encontramo-nos numa situação insustentável: por um lado, as nossas atividades são necessárias, mas por outro quem presta apoio médico corre o risco de ser perseguido pelas autoridades pelo desempenho do seu trabalho. De modo a conseguirmos cumprir os nossos deveres para com os pacientes, têm de ser estabelecidas pré-condições básicas que nos permitam realizar o nosso trabalho num ambiente seguro”, sublinha o coordenador de operações do projeto da MSF na África Central, Sylvain Groulx. “A MSF mantém-se disponível a continuar o diálogo com as autoridades, de forma a resolver esta questão o mais rápido possível, para que possamos retomar as nossas atividades médicas e humanitárias.”

A Médicos Sem Fronteiras, como organização médica internacional, fornece apoio médico de forma imparcial, a todos os pacientes que disso necessitam, de acordo com a lei humanitária internacional e com as normas da ética médica. “Para assegurar o acesso a cuidados médicos e a ajuda humanitária essencial, garantindo simultaneamente a segurança máxima das nossas equipas e pacientes, nos Camarões, assim como em qualquer parte do mundo, estamos em contacto com todas as partes armadas, estatais e não-estatais”, explica ainda Sylvain Groulx. “Isto não pode, de forma alguma, ser interpretado como falta de imparcialidade ou um ato de conspiração com quaisquer partes envolvidas na violência que está em curso nas regiões anglófonas”, acrescenta.

 

A MSF trabalha nos Camarões desde 1984. Atualmente, são desenvolvidos projetos no extremo Norte do país, assim como no Sudoeste e em Yaoundé, onde a organização apoia o acesso a serviços de saúde em comunidades e hospitais, prestando cuidados cirúrgicos, tratamento para a malária e para a COVID-19 e ações de promoção de saúde. Em 2020, a MSF tratou mais de um milhão de pacientes nos Camarões. Em dezembro do mesmo ano, as atividades da organização foram suspensas pelas autoridades da região Noroeste do país – a Médicos Sem Fronteiras continua a dialogar, ainda hoje, para reiniciar o apoio médico nessa zona. Na região Sudoeste dos Camarões, a organização médico-humanitária estava a colaborar com Ministério da Saúde para dar resposta a uma epidemia de cólera. A partir desta semana, a MSF não terá mais operações médicas em qualquer uma das regiões anglófonas do país.

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