MSF: um ano salvando vidas de refugiados sírios na Jordânia

Projeto de cirurgia de trauma da organização

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“Yasmina, minha filha de 9 anos, teve suas duas pernas e seu olho feridos por um estilhaço de bomba lançado em um barril de um helicóptero. A bomba explodiu quando ela caminhava da escola para casa. Yasmina e sua colega ficaram gravemente feridas e foram encaminhadas para a Jordânia. Desde o bombardeio, ela teve de ser submetida a três cirurgias. Ela está traumatizada, com medo de ir à escola. Qualquer coisa que traga lembranças da escola faz com que ela fica aterrorizada”, conta Ola, mãe de Yasmina, paciente de Dara’Al Balad.

“Fui vítima de uma mina enquanto tocava minhas ovelhas e perdi minhas duas pernas. Duas semanas depois, meu irmão foi ferido da mesma forma. Depois de quatro meses de tratamento, tentei usar minha prótese dois dias atrás, e fiquei muito feliz. É um sentimento que não dá para explicar. Não sabia que seria possível. Mal posso esperar para voltar à Síria e mostrar a minha família que posso andar novamente”, conta Nawaf, paciente de 45 anos.

O projeto da organização humanitária internacional Médicos Sem Fronteiras (MSF) de cirurgia de trauma próximo da fronteira da Jordânia com a Síria foi inaugurado em setembro de 2013. Desde então, a equipe do projeto conduziu mais de 2 mil cirurgias de grande porte, muitas das quais foram vitais para mais de 600 pacientes.

“Um dos nossos primeiros pacientes em estado grave foi admitido em setembro de 2013 após ter sido atingido por um bombardeio aéreo no sul da Síria. Ele disse à nossa equipe médica ‘deixem-me morrer, vocês não podem fazer nada por mim’”, conta Paul Foreman, coordenador-geral de MSF.

O paciente precisou de uma grande cirurgia e de três fixadores externos, aparatos que mantêm os ossos estáveis até que estejam recuperados. Após nove meses de cuidados no hospital e mais de 30 cirurgias, ele foi liberado.

“Não apenas sobrevivi, como estou apto a sair daqui caminhando”, disse o paciente ao coordenador-geral.

O programa de cirurgia de emergência do Hospital Governamental de Al Ramtha, onde MSF atua em parceria com o Ministério da Saúde da Jordânia, fica a cerca de 5 quilômetros da fronteira com a Síria. MSF administra dois centros cirúrgicos e duas salas de internação e recuperação, além de duas alas, que somam um total de 33 leitos. Mais de 140 profissionais nacionais a internacionais trabalham no projeto.

As operações conduzidas no centro de cirurgia de trauma envolvem o tratamento de ferimentos graves abdominais, no peito e ortopédicos e, além disso, serviços de terapia física, saúde mental e internação geral são oferecidos. Até o momento, um total de 1.100 consultas voltadas para a saúde mental foram realizadas.

Embora não estejam no país onde o conflito está acontecendo, equipes de MSF são testemunhas do impacto devastador da guerra na Síria por meio da intensidade dos ferimentos dos pacientes tratados. Apesar dos esforços, não são todos os pacientes que sobrevivem, devido à gravidade de alguns desses ferimentos e ao tempo que as pessoas podem levar para chegar até o hospital.

“Cada uma das mortes de pacientes afeta fortemente nossa equipe. Apesar de toda a habilidade, o trabalho duro e a dedicação, infelizmente, algumas pessoas não podem ser salvas”, afirma o coordenador-geral Paul Foreman.

“No último ano, 17 pacientes perderam suas vidas, o que significa que a taxa de mortalidade é de menos de 3%”, adiciona Paul. “Entre as causas primárias de morte estão as complicações associadas à gravidade dos ferimentos e à demora na chegada dos pacientes à sala de emergência, por causa das longas horas de transporte que têm de enfrentar vindo da Síria.”

Na medida em que o projeto crescia, em março de 2014 MSF inaugurou uma instalação para o pós-operatório no campo de refugiados de Al Zaatari. A instalação de 40 leitos é voltada para pacientes feridos de guerra transferidos de Al Ramtha e de outros hospitais na Jordânia. Até o momento, MSF internou 179 pacientes e, como parte do tratamento pós-ferimentos, mais de 190 consultas de saúde mental foram realizadas, bem como outros serviços de terapia física.

Ajudar na recuperação física e mental das pessoas após ferimentos traumáticos é parte essencial do projeto. Para ajudar nesse processo, MSF convidou Richard Whitehead, campeão paralímpico, para um encontro com os pacientes, para falar sobre sua deficiência. Ele corre com próteses, já que teve as duas pernas amputadas, e explicou como fez para superar os obstáculos sociais e se tornar um atleta profissional.

“Em uma situação de conflito, é muito importante tentar manter a positividade e guiar as pessoas no processo de recuperação, de retorno ao convívio com suas pessoas queridas. Espero que com alguém como eu as pessoas possam relacionar suas próprias circunstâncias à minha deficiência e verem os desafios que pude superar”, conta Richard.

Feridos de guerra internados no Hospital Governamental de Al Ramtha não são registrados como refugiados na Jordânia. Uma vez liberados do hospital, alguns retornam para a Síria, se não precisarem de acompanhamento médico. Outros seguem para os campos de refugiados na Jordânia, como o Al Zaatari, em Mafraq, onde MSF administra um centro de cuidados pós-operatórios. Se conseguirem ser “apadrinhados” por uma família jordaniana, podem morar em uma comunidade.

Desde o início do conflito na Síria, mais de 3 milhões de sírios buscaram refúgio em países vizinhos, como a Jordânia. MSF atua no país desde agosto de 2006 com um programa de cirurgia reconstrutiva em Amã. Desde 2013, a organização oferece suporte aos refugiados por meio do programa de cirurgia de trauma, além de um hospital materno-infantil e um projeto de doenças não transmissíveis em Irbid, para assistir tanto refugiados sírios quando jordanianos em situação de vulnerabilidade nas comunidades.
 

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