Quênia ainda se recupera de violência pós-eleições

Cerca de 600 pessoas morreram e outras milhares foram obrigadas a deixar suas casas após os confrontos

A violência desencadeada no Quênia após as eleições de 27 de dezembro afetou muitas pessoas. O país ainda está se recuperando dos confrontos durante os quais casas foram queimadas e saqueadas, fazendo com que milhares de pessoas deixassem suas casas e outras 600 morressem.

O trauma psicológico é evidente nas consultas realizadas pela enfermeira queniana, Albina Aluda, contratada por MSF para trabalhar na clínica temporária no acampamento de Langas. "Muitas pessoas vêm até nós dizendo que estão com dor de cabeça ou outros tipos de dores. Nós chamamos isso de síndrome de 'hapa hapa' (aqui, aqui). Eles apontam para eles mesmos e dizem sentir dores 'aqui' e 'aqui', mas na verdade são dores mais emocionais do que físicas".

No dia 2 de janeiro, uma equipe de MSF formada por uma enfermeira e um profissional de logística viajou para Eldoret, uma cidade do Quênia a 250 quilômetros a noroeste da capital Nairóbi. No auge dos episódios de violência pós-eleitorais, a cidade recebeu um grande fluxo de deslocados internos, o que levou MSF a dar início a uma intervenção de emergência. Hoje, a situação se acalmou, mas os deslocados internos mais pobres ainda não sabem qual será seu futuro.

Mwania já passou por isso. Durante os confrontos de 1992, ele veio buscar refúgio exatamente nessa região, na delegacia de polícia Langas em Eldoret. Quando voltou para seu vilarejo após os episódios violentos de 17 anos atrás, sua casa continuava intacta. "Dessa vez, não há nenhum lugar para voltar. Minha casa e todos os meus pertences foram queimados", contou ele. O futuro para esse avô e os dez integrantes de sua família que viajaram com ele é incerto. Por enquanto, eles continuarão no acampamento que se formou ao lado da delegacia de polícia.

Apesar das coisas estarem ficando relativamente calmas, a situação é imprevisível. Nos últimos dias, as equipes de MSF trabalhando em Eldoret, a quinta maior cidade do Quênia, para a qual milhares de pessoas foram quando tentavam fugir da violência, testemunhou uma rápida mudança.

Alguns dos acampamentos que estavam lotados com centenas de famílias há alguns dias agora estão completamente vazios, uma vez que muitas pessoas decidiram voltar para casa. Outros continuam cheios. As condições de vida nos acampamentos variam bastante. Poucos são bem organizados, uma vez que as pessoas que neles vivem deixaram suas casas quando estavam sendo ameaçados e conseguiram trazer a maioria de seus pertences com eles. Seus abrigos estão cheios de bicicletas, roupas, cobertores, alimentos, entre outras coisas. Outras fugiram quando suas casas foram queimadas e não têm nada.

Mas as milhares de pessoas que ainda estão vivendo nos acampamentos têm uma coisa em comum: eles não planejam partir tão cedo.

"Os deslocados internos que estão em Eldoret agora são os mais vulneráveis", explica Pierluigi Testa, coordenador do projeto de MSF na cidade. "A maioria deles está muito assustada ou é muito pobre para voltar para casa, mas grande parte deles não pode partir porque não têm mais suas casas".

MSF está presente em Eldoret desde o dia 2 de janeiro. No momento, uma equipe internacional de oito pessoas está visitando os assentamentos e acampamentos, levando assistência para os deslocados. No dia 3 de janeiro, MSF fretou dois aviões para transportar suprimentos. Desde então, as equipes distribuíram 6 mil cobertores, além de 2.250 kits com itens essenciais como lâminas de plástico para construir abrigos, galões para transporte de água e utensílios de cozinha para 20 mil beneficiários.

As equipes de logística construíram chuveiros e latrinas e garantiram que a água fosse tratada nos dois acampamentos. Em alguns deles, as unidades de saúde próximas estão lentamente voltando às suas atividades normais. MSF oferece apoio ajudando a equipe e fornecendo medicamentos e suprimentos. Em outras, médicos e enfermeiras de MSF dão consultas e tratam doentes. As queixas mais comuns são diarréia, escoriações e infecções respiratórias.

Apesar do trauma das semanas mais recentes, as necessidades médicas em Eldoret não são agudas. Se a situação no Quênia continuar a se estabilizar, MSF vai considerar o encerramento das atividades emergenciais. Um grande número de organizações começou agora a trabalhar em Eldoret e em seus arredores, muitas das quais estão mais aptas a responder a necessidades de longo prazo.

As unidades de saúde e hospitais que foram fechados devido à falta de equipe durante o pior período de violência estão funcioando novamente e devem atender as necessidades da população. MSF vai continuar a monitorar a situação em Eldoret, mas vai concentrar seus esforços em locais mais remotos, como as áreas rurais próximas a Molo, onde a assistência é necessária.

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