Respondendo a emergências dentro de emergências em Honduras

Respondendo a emergências dentro de emergências em Honduras

Marta Jiménez trabalhou como coordenadora médica no projeto de Médicos Sem Fronteiras (MSF) em Choloma, Honduras, de outubro de 2020 até maio de 2021. Ela é enfermeira, com experiência em países como Jordânia, Guiné Bissau, Espanha, Camarões, Congo, Costa Rica e Venezuela. Ela chegou a Honduras uma semana antes do furacão Eta e trabalhou como parte da resposta de MSF às consequências humanitárias do desastre. Em seguida, Marta atuou para prestar assistência médica aos milhares de migrantes na primeira caravana de 2021. Em entrevista, ela descreve como foi atuar com MSF em Honduras e qual a atual situação dos migrantes no país:

Quais foram os desafios em um contexto de emergência da COVID-19 e furacões?

Foi uma experiência e tanto, graças ao número de decisões que tive de tomar e à rapidez com que agi durante a pandemia. São tantos os elementos que devem ser levados em consideração para o cumprimento das medidas de biossegurança. As atividades simples são lavar as mãos ou usar uma máscara, mas quando se está planejando uma emergência no meio de uma pandemia, é preciso pensar nas limitações. Por exemplo, o pequeno número de pessoas que podem viajar em um veículo. Você precisa do dobro de recursos logísticos para o mesmo número de pessoas em uma única operação. No entanto, nosso objetivo era manter a qualidade do atendimento médico de MSF sem colocar nossa equipe em risco.

Para quem MSF prestou assistência médica durante a emergência do furacão?

Nosso grupo alvo era a população inteira. Os furacões dessa magnitude levam tudo embora. Já estávamos realizando um projeto de longo prazo em Choloma com algumas das comunidades mais atingidas. Eles já eram o grupo mais vulnerável, vivendo em abrigos de construção precária em áreas propensas a inundações. Nossa prioridade era atender às necessidades básicas de pessoas que haviam perdido tudo; eles precisavam de abrigo e proteção.

Quais lições você aprendeu?

No nível profissional, a preparação teórica realmente funciona; você deve seguir os passos pré-definidos em caso de emergência. Isso faz com que você trabalhe automaticamente e comece a tomar decisões imediatamente com as informações que possui. Você sabe o que pedir na farmácia, o que precisa para doenças vetoriais. É preciso colocar os procedimentos em prática.

No nível operacional, aprendi a importância da colaboração entre entidades estaduais e organizações como MSF, para que possam coordenar e evitar a duplicação de funções ou a negligência de prioridades. Em um nível pessoal, eu realmente valorizo a maneira como os membros da comunidade ajudam uns aos outros. A frase que se repetia entre os afetados era: “só o povo salva o povo”, e eles continuavam com esse espírito, ajudando uns aos outros. Um vizinho cozinhava para todos e outro recebia cobertores de outro município.
Como foi a experiência de prestar cuidados a uma caravana de migrantes?

A primeira lição que aprendi é que todo o processo de migração é muito mais complexo do que apenas a caravana. A caravana é uma das formas que os hondurenhos encontraram para sair do país. A experiência foi intensa. A organização da caravana é improvisada, as informações fornecidas não são verificadas e nada é totalmente preciso ou confirmado. Estamos falando de um número muito grande de pessoas, que influencia tudo, inclusive as equipes de resposta, segurança e alocação de recursos. É preciso se adaptar. Planejar a prestação de cuidados de saúde para 60 pessoas não é o mesmo que planejar para 6 mil. Mas não se tem essa informação até a partida da caravana.

Cuidar de uma pessoa no início de sua jornada é muito diferente de cuidar de uma pessoa no final, quando já existe uma necessidade médica ou psicológica evidente. O cuidado com os migrantes desde sua origem é preventivo. O importante é prepará-los para o que vai acontecer na rota de migração; dar a eles as ferramentas e recursos para lidar com isso. Disponibilizamos sais de reidratação, meias e sabonete para manter a sua condição física. Fornecemos ferramentas de autocuidado, bem como proteção emocional, para ajudá-los a lidar com o que enfrentarão na viagem.

Como os migrantes que deixam Honduras por motivos de violência física ou sexual estão preparados?

Sabemos que uma das razões pelas quais essas pessoas decidem migrar é porque sofreram ameaças, extorsões e violência física e emocional. A violência em Honduras é crônica e assimilada como uma condição normal; é endêmica.

Cada pessoa reage de maneira diferente quando foge de uma situação de violência e decide migrar. Algumas pessoas sentem muito medo, pânico e incerteza. Outras conseguiram sair de situações de violência e sentem que esta é uma rota de fuga, uma boa saída. Elas enxergam de uma forma muito diferente, com entusiasmo e otimismo desde o momento em que começam a planejá-lo. Alguns decidem no mesmo dia, com o que têm disponível e sem informação.

As consequências do furacão e da crise migratória exigem atenção técnica específica das equipes de MSF. Este intercâmbio, o conhecimento do contexto, as experiências acumuladas, as lições aprendidas e a sistematização do processo permitiram que MSF identificasse os grupos mais vulneráveis em oito municípios onde serão oferecidos cuidados de saúde em 2021.

 

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