Coronavírus (2020/21)

Com a chegada da pandemia do novo coronavírus ao Brasil e a rápida expansão dos casos, MSF mobilizou um volume inédito de recursos humanos e materiais em nosso país e conseguiu rapidamente iniciar atividades direcionadas ao atendimento das populações mais vulneráveis: pessoas em situação de rua, migrantes e refugiados, indígenas, usuários de drogas e idosos.  Essas populações, que já se encontravam em estado de grande vulnerabilidade mesmo antes da pandemia, passaram a enfrentar uma situação ainda mais grave. MSF deu suporte também a sistemas de saúde fragilizados e com dificuldade de responder à forte demanda. Desde o início da pandemia, já atuamos nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Amazonas, Roraima, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás e Rondônia.

Veja a seguir um resumo de nossas principais atividades relacionadas à pandemia do novo coronavírus no Brasil:

Rondônia

Em março de 2021, passamos a apoiar o sistema de saúde de Porto Velho com suporte a Unidades de Pronto Atendimento (UPAs). Essas instalações geralmente fazem apenas atendimento de emergência, mas com o colapso do sistema de saúde local, estão tendo de internar pacientes de COVID-19, alguns em estado grave. Além do reforço no atendimento, equipes locais recebem treinamento em controle e prevenção de infecções.

Amazonas

Em dezembro de 2020, MSF reabriu dois projetos de resposta à pandemia de COVID-19 nas cidades Tefé e São Gabriel da Cachoeira, no interior do Amazonas, ao detectar elevação no número de casos no estado, após ter atuado na primeira onda dos contágios entre julho e agosto do ano anterior. No entanto, em janeiro de 2021 o sistema de saúde de Manaus entrou em colapso com o exponencial aumento de pessoas em estado grave e com a falta de oxigênio para pacientes hospitalizados, afetando cidades do interior do estado que dependem dos centros de saúde da capital para tratar casos graves.

Em apoio, MSF passou a atuar novamente em Manaus com atendimento a pacientes com COVID-19 e suporte de saúde mental aos profissionais de saúde. Além disso, ampliou a resposta à emergência nas cidades de São Gabriel da Cachoeira e Tefé, com equipes nos hospitais dos dois municípios, doação de ferramentas médicas, clínicas móveis e atividades de promoção de saúde.

Em dezembro, o hospital regional de Tefé, que atende uma população de 60 mil habitantes além de outros cinco municípios próximos, recebeu novamente apoio de MSF, que forneceu treinamentos e adaptou a estrutura para implementar medidas de prevenção e controle de infecções. Na época, MSF também doou 50 cilindros de oxigênio para o centro de saúde.

Da mesma forma, em São Gabriel da Cachoeira, a 852 km de Manaus e com uma população composta em 90% por indígenas, MSF trabalhou entre julho e o início de agosto em um centro de tratamento que ajudou a complementar a capacidade do hospital local dedicado à COVID-19. No retorno à cidade em dezembro, a prioridade foi criar capacidade de testagem no próprio município, já que as amostras precisavam ser transportadas até Manaus, retardando em vários dias a identificação de casos da doença. Com o agravamento dos casos, reiniciamos o trabalho de atendimento aos pacientes no hospital local, além de levar cuidados de saúde para a população por meio de clínicas móveis e ações de promoção de saúde.

O trabalho em Manaus, realizado nos meses de maio e junho, reforçou a estrutura de atendimento de pacientes graves e moderados de COVID-19, além de atuar com detecção de casos e promoção de saúde em abrigos para a população em situação de rua, migrantes e indígenas. No final do mês de maio, iniciamos a implantação de 12 leitos de UTI e 36 leitos para casos moderados no hospital 28 de Agosto. A equipe de MSF incluiu pessoal especializado em UTI, alguns com experiência prévia no tratamento de COVID-19 em outros países, e implantou novos protocolos para o tratamento não invasivo com oxigênio. Com isso, conseguiu oferecer um ambiente mais seguro para um melhor atendimento clínico.

MSF atuou em seis abrigos para refugiados e pessoas sem moradia na cidade, com sessões de promoção de saúde e vigilância médica para identificar pessoas com suspeita de COVID-19. Em parceria com a prefeitura de Manaus, MSF trabalhou no centro de isolamento e observação para indígenas da etnia warao com casos leves de COVID-19. Como grande parte dessa população, que veio da Venezuela para o Brasil, vive em abrigos da cidade, ela é especialmente vulnerável à doença pela dificuldade de manter medidas adequadas de higiene e de distanciamento social.

Em janeiro de 2021, com o colapso do sistema de saúde da capital, reiniciamos as atividades na cidade com atendimento de saúde mental para profissionais de saúde no hospital 28 de Agosto e com equipes médicas especializadas na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) José Rodrigues.

Mato Grosso do Sul

MSF atuou em 11 comunidades indígenas da região de Aquidauana entre o final de agosto e meados de outubro. O trabalho foi feito em conjunto com as secretarias de saúde do Estado e do município, além dos organismos responsáveis pela saúde indígena. A principal estratégia para realizar a detecção de casos da doença e disseminar ações de prevenção foi a realização de visitas com equipes móveis, percorrendo aldeias da região que têm tido dificuldades de acesso à saúde em meio a altos índices de contágio pelo novo coronavírus. MSF também apoiou com profissionais, treinamentos e fornecimento de equipamentos de proteção o hospital municipal de Aquidauana.

Em Corumbá, uma equipe de MSF atuou entre setembro e outubro na prevenção, detecção e tratamento da COVID-19 entre servidores e detentos no presídio masculino da cidade sul-matogrossense. A solicitação foi feita pela Secretaria de Saúde do Estado, já que nos locais praticamente não havia acesso a cuidados médicos, com índices de contaminação elevados. Também foram realizados treinamentos para prevenção e controle de infecções na penitenciária feminina da cidade.

Roraima

Nos últimos anos, Roraima recebeu uma grande quantidade de migrantes. No final de 2018, MSF iniciou as atividades de seu projeto na capital Boa Vista, com o objetivo de apoiar o já fragilizado sistema de saúde local. Com a pandemia, MSF manteve seu projeto e adaptou parte das ações para o combate à COVID-19.

Entre junho e o início de setembro de 2020 colaboramos com o atendimento dos pacientes no hospital de campanha erguido especialmente para os pacientes com COVID-19 em Roraima. MSF apoiou as atividades desta unidade com atendimentos médicos dos pacientes e assistência em saúde mental. Entre junho e o começo de agosto do mesmo ano, realizamos treinamento em cuidados intensivos e supervisão das atividades da UTI, e o trabalho foi importante para viabilizar o funcionamento efetivo das instalações médicas.

Também temos realizado triagem de pacientes em locais frequentados pelos migrantes, como abrigos informais. Adicionalmente, foram realizadas melhorias nas condições sanitárias e acesso à água para essa população, com promoção de saúde e distribuição de kits de higiene.

Na cidade de Pacaraima, na fronteira com a Venezuela a 214 km de Boa Vista, MSF realizou treinamento com equipes do hospital local para prevenção, controle de infecções e promoção de saúde. MSF também ofereceu apoio em saúde mental para profissionais de saúde da cidade. O objetivo de MSF é permitir que as equipes que trabalham na resposta à COVID-19 em cada localidade estejam mais bem preparadas para enfrentar a doença.

São Paulo

Atuamos na assistência médica a moradores de regiões da periferia e de favelas do município. Foram realizadas consultas médicas para detecção de casos suspeitos de COVID-19 e triagem com encaminhamento dos doentes em estado moderado para centros de isolamento e daqueles em estado grave para hospitais. O trabalho também incluiu orientações sanitárias e de distanciamento social àqueles com sintomas, para tentar evitar a disseminação do novo coronavírus.

Até o início de outubro, trabalhamos na assistência a casos graves, contribuindo com oito leitos da UTI do Hospital Tide Setúbal, na zona leste da capital. Na mesma região, atuamos em comunidades com triagem de casos suspeitos e educação em saúde.

Depois de obter resultados positivos com a melhora dos índices de recuperação de pacientes na UTI, a gestão dos leitos foi transferida ao próprio hospital. Mas passamos a trabalhar na mesma unidade, em novembro, com a prestação de cuidados paliativos. Os cuidados foram oferecidos de forma complementar para alívio de sintomas a pacientes em estado grave que não apresentavam boa resposta ao tratamento.

Anteriormente, MSF realizou atendimento médico de casos moderados da doença em centros de tratamento construídos pela prefeitura, com um total de 140 leitos, especialmente para acolher pessoas em situação de rua. Trabalhamos também com jovens em centros de detenção para adolescentes e estivemos presentes no atendimento a pessoas que fazem uso de drogas na área conhecida como Cracolândia, levando informações sobre prevenção e contágio da doença e detectando casos suspeitos. Logo no início da pandemia, estivemos na região central da cidade fazendo triagem e ações de educação em saúde para pessoas em situação de rua.

Rio de Janeiro

Nossas equipes realizaram ações de promoção de saúde e triagem em locais frequentados pela população em situação de rua e em restaurantes populares.

Também foram efetuados treinamentos de controle e prevenção de infecções para profissionais de saúde. MSF continua monitorando os dados epidemiológicos e a evolução da pandemia na cidade.

Migração em Roraima (2019)

Desde outubro de 2018, oferecemos suporte psicossocial e atividades de promoção de saúde e sensibilização da comunidade em Roraima para a população de migrantes venezuelanos que deixou seu país de origem.

Em julho de 2019, também começamos a oferecer consultas médicas para aliviar o sistema de saúde pública do estado, que se viu sobrecarregado com as novas demandas. Por isso, atuamos em postos de saúde públicos, atendendo brasileiros e venezuelanos. Os casos mais frequentes que recebemos, como os de diarreia, estão ligados às más condições de vida de muitos dos migrantes.

Nos atendimentos focados em saúde mental, além de sessões de psicoterapia individuais e em grupo, nossa equipe de psicólogos realiza encontros com crianças e adolescentes, com foco em três pilares: identidade, família e autoestima; inclusão e pertencimento; e proteção e ferramentas contra abuso. No abrigo de migrantes indígenas de Boa Vista, onde as condições sanitárias não eram adequadas, uma equipe de água e saneamento trabalhou na elaboração de melhorias das instalações e da disponibilidade de pontos de água para consumo. As obras correspondentes foram assumidas pela Operação Acolhida.

Brumadinho, Minas Gerais (2019)

Atuamos no apoio às pessoas afetadas pelo rompimento da barragem que armazenava rejeitos da mineração de ferro na região de Brumadinho (MG), ocorrido no dia 25 de janeiro.

Médicos Sem Fronteiras (MSF) enviou à localidade duas psicólogas e uma psiquiatra com o objetivo de fornecer treinamento na área de saúde mental em desastres aos profissionais do Sistema Único de Saúde (SUS) e demais profissionais da área que integram a rede de cuidados à população afetada. O trabalho da organização foi feito de maneira articulada com as equipes do SUS e demais atores presentes no município e foi concluído no fim de fevereiro.

Capacitamos os profissionais locais para identificar as pessoas que necessitam de acompanhamento psicológico e encaminhá-las para a rede de cuidados que foi formada após o desastre. Desta forma, os pacientes poderão ser acompanhados por profissionais no médio e longo prazo, quando necessário. Além disso, foram realizados atendimentos pontuais aos próprios profissionais de saúde, que também foram afetados pelo impacto da tragédia.

Nossa experiência em desastres mostra que é extremamente importante oferecer serviços de saúde mental já nos primeiros momentos após eventos dessa magnitude, como parte da estratégia para lidar com uma grande emergência como essa.

Ajuda humanitária a haitianos em Tabatinga (2011 -2012)

MSF iniciou suas atividades em Tabatinga, na tríplice fronteira entre Brasil, Peru e Colômbia, em dezembro de 2011. Na época, mais de mil haitianos que haviam chegado ao Brasil fugindo das dificuldades de um país devastado por um terremoto, aguardavam um protocolo da polícia Federal que lhes permitisse sair da cidade e trabalhar. Enquanto aguardavam, grande parte vivia em condições extremamente precárias e com acesso limitado a cuidados de saúde, sem qualquer assistência das autoridades locais, estaduais ou federais.

Em oito semanas, MSF distribuiu mais de 1.800 kits de higiene contendo itens como escova e pasta de dente, sabão, balde e toalha, para facilitar a manutenção de condições mínimas de higiene e evitar, assim, a degradação do estado de saúde dos haitianos.  Foram distribuídos também kits família, com vassouras, água sanitária e outros produtos de limpeza.

Nossa equipe também realizou atividades de promoção de saúde com o objetivo de melhorar a prevenção de doenças e facilitar o acesso dos haitianos ao sistema público de saúde, fazendo a ponte entre os serviços locais e a população de imigrantes.  Para isso, MSF desenvolveu material de educação em saúde em crioulo, a língua falada no Haiti.

As condições de vida difíceis e a incerteza sobre futuro provocaram sintomas de estresse agudo, como insônia, perda do apetite, dificuldades para respirar e dores corporais. Por isso, além do trabalho educacional e da distribuição dos kits, MSF também ofereceu apoio em saúde mental individual e em grupo.

Os principais problemas de saúde observados foram dermatites, doenças gastrointestinais, febres sem causa esclarecida e infecções respiratórias, doenças normalmente associadas às condições de vida e de habitação. No entanto, MSF avaliou que o sistema de saúde público poderia dar conta dessa demanda.

Em meados de fevereiro de 2012, após encerrarem as atividades em Tabatinga, profissionais de MSF foram para Manaus para trabalhar com haitianos que, de posse do protocolo de visto, documento que lhes permite viajar dentro do país e trabalhar, haviam ido para a  capital do estado em busca de trabalho. Foi uma rápida passagem de 20 dias em que MSF trabalhou junto com profissionais locais para montar uma estratégia de inserção dos haitianos no sistema público de saúde e de atendimento de saúde mental.

 

Capacitação na região de Itaperuna (2012)

Duas psicólogas de MSF foram enviadas a Itaperuna, cidade situada entre os Estados do Rio de Janeiro e Minas Gerais, para capacitar os profissionais locais a oferecerem assistência psicológica às vítimas das enchentes na região. Diversas cidades do entorno sofreram com as fortes chuvas em janeiro de 2012, que causaram sérias enchentes e deslizamentos e que deixaram dezenas de mortos e desabrigados.

Mais de 50 pessoas participaram da primeira capacitação. O trabalho foi uma resposta a um convite feito pela Defesa Civil do Estado do Rio de Janeiro.

Capacitação na região serrana do Rio de Janeiro (2011)

Cidades na região serrana do Rio de Janeiro foram atingidas por fortes chuvas, em janeiro de 2011, que causaram mais de 700 mortes. Psicólogos de MSF treinaram profissionais de saúde mental que trabalharam na região atingida pelas cheias. A capacitação foi o principal foco do nosso trabalho nesta emergência. A estratégia de qualificar os profissionais em vez de fazer atendimento direto à população busca atingir um público grande mesmo com uma equipe reduzida. Além dos treinamentos, MSF colaborou com a organização dos voluntários que trabalharam na cidade para evitar esforços desnecessários.

Depoimento

“Essa capacitação me deu um novo olhar sobre o que está acontecendo e me despertou para coisas que estavam passando despercebidas por mim. E o mais importante é que a presença das psicólogas de MSF me deu segurança para trazer à tona tudo o que eu já sabia. Por também ter sido vítima eu estava muito abalada”. Ozimar Verly, neuropsicóloga.

 

Auxílio para as vítimas de Alagoas (2010)

Em junho de 2010, fortes enchentes atingiram os estados de Pernambuco e Alagoas, no nordeste do Brasil. As inundações deixaram milhares de casas completamente destruídas. Em alguns lugares, a população inteira foi afetada pelo desastre e muitas famílias perderam todos os seus pertences. Equipes de MSF ofereceram apoio psicológico, distribuíram kits com itens básicos de sobrevivência, melhoraram as condições de água e saneamento, além de realizar monitoramento e treinamentos na região.

MSF doou conjuntos de material para limpeza de latrinas, adaptou tanques de água, construiu locais para banho, distribuiu kits de higiene (sabonete, toalha, bacias, escova de dente) e kits não-alimentares (lonas plásticas, colheres e baldes), realizou monitoramento para detectar o surgimento de casos de doenças como leptospirose, dengue, diarreia, doenças de pele e infecções respiratórias e ofereceu treinamento em cuidados de saúde mental a profissionais, médicos e não-médicos, para ajudá-los a identificar problemas psicológicos nos pacientes.

 

Unidade de Emergência do Complexo do Alemão (2007 – 2009)

Em outubro de 2007, inauguramos, no centro do Complexo do Alemão, na Comunidade da Fazendinha, a Unidade de Emergência de MSF. Na clínica, as equipes ofereceram atendimento de emergência, cuidados de saúde mental, transferência em ambulância para hospitais da região e orientação sobre a rede pública de saúde do município.

A Unidade de Emergência de MSF funcionou até o fim de 2009, quando as atividades na clínica foram encerradas. Nos mais de dois anos de funcionamento, a equipe de MSF atendeu majoritariamente pacientes com problemas de saúde primária, tendo realizado mais de 19 mil consultas médicas. Além disso, prestou atendimento emergencial, com 650 resgates de ambulância, e ofereceu cuidados de saúde mental a 2 mil pacientes. A maioria destes atendimentos foi a mulheres adultas apresentando quadros depressivos, ansiosos e psicossomáticos (aproximadamente 47%), além de crianças e adolescentes com problemas de aprendizagem e agressividade (aproximadamente 43%).

A unidade de saúde do Complexo do Alemão, a exemplo de outras que MSF abriu em diferentes comunidades do Rio de Janeiro, deveria ser retomada pela Prefeitura, segundo acordo assinado em 2008. Com o descumprimento do acordo por parte da Prefeitura, MSF, uma organização que não se propõem a substituir o poder público, se viu obrigada a dar fim às atividades em novembro de 2009, como previsto desde o início do projeto.

Oficinas de Capacitação em Gestão de Risco (2006)

Em maio de 2006, MSF iniciou, em parceria com a prefeitura do Rio de Janeiro, Oficinas de Capacitação em Gestão de Risco para equipes do Programa de Saúde da Família, que atuam em áreas de vulnerabilidade social na cidade.

Mais de 700 médicos, enfermeiros e agentes comunitários de saúde receberam treinamento de profissionais de MSF, com recomendações sobre como agir diante das situações de violência nas áreas onde trabalham. A tarefa dos participantes foi não só ouvir e trocar experiências, mas também apresentar propostas para a elaboração de um guia de segurança.

 

Centro de Atenção Integral à Saúde de Marcílio Dias (2003-2005)

Marcílio Dias é uma comunidade carente situada em uma área de difícil acesso na região norte da cidade do Rio de Janeiro, localizada no Complexo da Maré. Seus mais de 7 mil moradores enfrentam, além da violência e das dificuldades econômicas geradas pelo alto índice de desemprego, dificuldades de acesso a cuidados médicos.

Para melhorar o acesso dos moradores de Marcílio Dias a serviços de saúde e psicossociais, MSF começou, em 2003, um projeto na comunidade. As atividades foram iniciadas em um consultório na Associação de Moradores da comunidade, enquanto um espaço estava sendo adaptado para funcionar como Centro de Saúde. Em julho de 2003, com a conclusão das obras, MSF inaugurou o Centro de Atenção Integral à Saúde de Marcílio Dias.

O objetivo do projeto era melhorar as condições de saúde gerais e a situação psicossocial da população implantando uma unidade básica de saúde na comunidade, que contou com uma equipe multidisciplinar: médicos, assistentes sociais, psicólogos, enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem, entre outros profissionais.

Neste período, o Centro de Saúde ofereceu atendimento de clínica geral, pediatria e ginecologia à população, além de consultas psicológicas, apoio de serviço social e atividades socioeducativas, tais como oficinas de artesanato, fuxico, crochê e bordado, realizadas por voluntários.

MSF também organizava grupos de reflexão com mulheres e jovens na comunidade. Um grupo de adolescentes escrevia e editava o jornal comunitário “Jovens em Ação” com supervisão de uma psicóloga e da equipe de comunicação de MSF.

Ao longo de quase três anos, MSF realizou 25.927 mil consultas médicas, 6.602 mil consultas de enfermagem e 43.778 procedimentos de enfermagem, 3.236 mil atendimentos psicológicos e 5.057 atendimentos sociais, 6 campanhas nacionais de vacinação e 2 Ações Sociais Comunitárias. Pode-se dizer que 99% dos pacientes receberam toda a medicação prescrita e 3.891 mil pessoas participaram de atividades psicossociais, como grupos de jovens e mulheres, atividades culturais e desportivas.

Em dezembro de 2005, o Centro de Saúde de Marcílio Dias passou a ser gerido pela ONG comunitária Movimento de Gestão Comunitária (MOGEC), com verbas da Secretaria Municipal de Saúde. O MOGEC foi criado a partir de um projeto de capacitação de gestores comunitários de MSF (1997 e 2001).

 

Projeto Meio-fio (2000-2004)

Num país marcado pela desigualdade social e pelo aumento dos índices de pobreza nas últimas décadas, o Rio de Janeiro, como outras grandes cidades brasileiras, assiste a um crescimento do número de pessoas morando nas ruas, desabrigadas e cada vez mais excluídas socialmente.

Buscando oferecer melhor qualidade de vida para essas pessoas, com um processo de escuta diferenciado das demandas desta população e encaminhando os casos de saúde e psicossociais aos serviços públicos existentes, MSF deu início, no ano 2000, ao projeto Meio-fio. O projeto também desenvolveu, ao longo de quatro anos e meio, atividades de sensibilização para reduzir o nível de preconceito tanto da sociedade, quanto dos profissionais dos serviços públicos.

Nesse período, uma equipe multidisciplinar de MSF – formada por médicos, enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais e promotores de saúde – percorria as ruas do centro do Rio de Janeiro abordando os beneficiários na própria rua, oferecendo assistência primária no local, e, quando necessário, encaminhando-os para os serviços existentes.

Atividades realizadas

A proposta de MSF nunca foi a de substituir o poder público local, mas estimular uma atenção diferenciada das autoridades municipais, estaduais e federais a esta população tão marginalizada. Por isso, concomitantemente a um trabalho de sensibilização dos profissionais de saúde e das autoridades locais, MSF forneceu instrumentos para que a população em situação de rua pudesse ser autossuficiente na busca pelos seus direitos.

Durante o funcionamento do projeto Meio-fio foram distribuídos 2000 guias de serviços com endereços úteis e informações relevantes sobre os serviços públicos e gratuitos oferecidos na cidade do Rio de Janeiro. Além disso, MSF disponibilizou um guia de procedimentos aos profissionais de instituições públicas; realizou dois seminários sobre a população em situação de rua, em parceria com outras instituições; promoveu oficinas e palestras de sensibilização para profissionais de instituições públicas; participou da formação de uma rede de instituições capaz de oferecer assistência e defender a elaboração de políticas públicas; fundou a Comissão Permanente de Monitoramento das Políticas Públicas para a População em Situação de Rua, em parceria com outras entidades públicas e não governamentais, que funciona até hoje dentro da Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro e realizou uma exposição fotográfica para sensibilizar a sociedade sobre as dificuldades enfrentadas por esta população, entre tantas outras atividades.

Denúncias sobre desrespeito

MSF também denunciou às autoridades locais e às diversas comissões de Direitos Humanos do país, situações de desrespeito e brutalidade testemunhadas ao longo desses anos pela equipe do projeto Meio-fio. Guardas Municipais, acompanhados de caminhões da Comlurb (Companhia de Limpeza Urbana da Cidade do Rio de Janeiro), realizam com frequência uma operação conhecida como Cata-tralhas, para recolher os pertences dos moradores de rua. Esta operação tem consequências sérias, já que, além de recolher o lixo deixado nas ruas por essa população, recolhe também medicamentos, roupas, instrumentos de trabalho e objetos pessoais como documentos e fotografias. Além do desrespeito, essas operações contribuem para piorar os já sobrecarregados serviços públicos oferecidos, uma vez que os moradores de rua retornam aos serviços para requisitar novamente os medicamentos, os exames e os documentos recolhidos.

Depoimento

“Hoje, os Médicos Sem Fronteiras são a minha família. Como é que pessoas, um grupo, uma organização não governamental acolhe com tanto carinho as pessoas em situação de rua, e trata delas? Eu tenho que ter carinho comigo mesmo para ser digno do carinho que dão para mim. Então, acho que a primeira coisa para sair desta situação é se amar, e eles me mostraram o caminho do amor”. Lísias Valério Bergo, beneficiário do projeto Meio-fio.

 

Vale do Jequitinhonha (2002)

Em janeiro de 2002, o nordeste de Minas Gerais foi atingido por fortes chuvas que causaram a cheia dos rios Jequitinhonha e alguns de seus afluentes, deixando cidades isoladas e milhares de pessoas desabrigadas. Uma equipe de MSF foi enviada ao Vale do Jequitinhonha para avaliar a situação e estudar a possibilidade de intervenção. A aproximadamente 800 Km de Belo Horizonte, os municípios atingidos tiveram acesso ainda mais restrito, com a queda de pontes e a interdição de estradas.

MSF visitou os municípios de Rubim, Jacinto e Almenara, e pôde constatar a precariedade dos recursos governamentais para lidar com a emergência. Em 43 municípios, foi decretada situação de emergência e, em 25, estado de calamidade pública. As famílias desabrigadas e desalojadas foram acolhidas em escolas municipais e estaduais. Os estoques de medicamentos essenciais de Rubim e Jacinto eram escassos e, com o advento das chuvas, o risco de epidemias tornou-se ainda maior.

Diante da dificuldade das autoridades locais em responder à catástrofe e da inexistência de outras instituições capazes de prestar socorro às vítimas da enchente, MSF decidiu então intervir no Vale do Jequitinhonha. Foi enviada ao local uma equipe multidisciplinar, composta por 3 enfermeiros, uma psicóloga e uma responsável logística, que atuou nos municípios de Rubim, Jacinto, Almenara e Sta. Maria do Salto, identificados como locais de maior necessidade de apoio.

As consultas de enfermagem se concentraram no município de Jacinto e seus distritos – Bom Jardim, Jaguarão e Avaí. Além do atendimento nas unidades de saúde locais e das visitas domiciliares, foram realizadas atividades de sala de espera, que abordaram temas como hanseníase, leishmaniose e aleitamento materno. O trabalho possibilitou o levantamento dos problemas mais comuns da região, como alta incidência de verminose e de hipertensão, além das deficiências estruturais do sistema de saúde local.

O atendimento psicológico se concentrou na cidade de Rubim. Durante o trabalho, foram detectados tanto problemas pontuais, decorrentes do trauma da enchente, como problemas pré-existentes, que haviam sido potencializados pela vivência da crise. Além de atendimentos individuais, foram feitos trabalhos também com casais, famílias e em grupos. Com as crianças que estavam abrigadas em uma escola local, foram desenvolvidas atividades lúdicas, que incluíram jogos e brincadeiras, além de um grande desenho coletivo, através do qual as crianças puderam representar situações emocionais.

Além do apoio profissional, MSF também enviou ao local 400 caixas de suprimentos de saúde, contendo uma variedade de 120 itens, desde medicamentos básicos a material hospitalar. Uma responsável logística, enviada por MSF, supervisionou e coordenou a entrega do material às secretarias municipais de saúde da região, assim como a distribuição de 390 kits de higiene, enviados às famílias desalojadas e desabrigadas pela enchente.

Um dossiê sobre a falta de resposta do poder público também foi preparado e enviado às autoridades responsáveis, na tentativa de que fossem tomadas medidas concretas que resolvessem os problemas de saúde e moradia das vítimas da enchente no Vale do Jequitinhonha. A intervenção emergencial de MSF no Vale durou 9 dias.

Depoimento

“No Vale do Jequitinhonha, há desigualdade social, uma infraestrutura precária de saúde e a população fica à mercê da ineficácia de ações de saúde. Enquanto estávamos lá, as consultas lotavam o dia inteiro sem intervalo. Quando chegávamos nas cidades, as pessoas anunciavam no microfone da igreja: chegaram!” Eriedna Barbosa, enfermeira de MSF que atuou na enchente do Vale do Jequitinhonha.

 

Barra Mansa e Resende (2000)

Intervenção de emergência após enchente nas cidades de Resende e Barra Mansa, no Rio de Janeiro.

No início de 2000, chuvas fortes no Sudeste do Brasil atingiram São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro. No interior do Rio de Janeiro, os municípios de Resende e Barra Mansa sofreram mais com as chuvas, devido à presença do rio Paraíba do Sul e alguns de seus afluentes, que transbordaram e atingiram a população ribeirinha.
Nestes municípios, aproximadamente 200 famílias ficaram desabrigadas e, 1673, desalojadas. Com o apoio da Secretaria de Estado de Ação Social, elas receberam ajuda financeira de um salário mínimo no período de três meses, cestas básicas, roupas e colchões. A Secretaria pediu a MSF que estudasse o que a organização poderia fazer para apoiar o trabalho de assistência a esta população. Diante da avaliação feita no local, MSF criou uma proposta de trabalho conjunto com as prefeituras para levar conhecimentos técnicos e organizacionais específicos para enfrentar situações de emergência.

Na primeira fase do projeto, uma assistente social de MSF atuou nos 2 municípios. Em contato com a realidade local, apoiou as Secretarias de Ação Social para a assistência das vítimas e iniciou a articulação dos setores interessados.

Na segunda fase, MSF ampliou sua equipe com um consultor internacional, especializado em gestão de desastres, que trouxe os conceitos de sistema de gestão de desastre natural e capacitou os participantes do projeto.

Na terceira fase, ficaram estabelecidas a elaboração dos planos de emergência e a formação das equipes de intervenção, para posteriores discussões e análises desses planos junto a MSF.

Durante o projeto, MSF realizou visitas à população e aos locais atingidos pelas inundações e analisou as medidas já tomadas pelo município. O plano de ação de MSF buscou também orientar os participantes para o desenvolvimento de um trabalho socioeducativo junto à população atingida e para um trabalho articulado com os setores da sociedade civil e os órgãos governamentais.

 

Médicos Solidários (1998-2001)

De um lado, pessoas que vivem em situação extrema de carência e têm dificuldade de acesso à saúde. De outro, médicos que se dispõem a doar algumas horas para atender, em seus próprios consultórios, aqueles que precisam. Foi para unir esta demanda e oferta que surgiu Médicos Solidários.

O projeto consiste em uma rede de médicos voluntários que atende moradores de comunidades carentes do Rio de Janeiro, encaminhados por instituições sociais, como associações de moradores, creches comunitárias, ONGs e entidades filantrópicas. Uma central de atendimento recebe os pedidos e agenda as consultas. Os exames solicitados são realizados gratuitamente por laboratórios parceiros do projeto.

Médicos Solidários teve início em outubro de 1998, oferecendo uma média mensal de 26 consultas e chegou a 2001 com uma média mensal de 931 consultas. Hoje, a rede conta com mais de 170 médicos cadastrados, das mais variadas especialidades, e 42 instituições sociais beneficiadas.

Para realizar o trabalho, Médicos Solidários conta com uma assistente social, que faz o acompanhamento de todas as instituições cadastradas e beneficiadas. Em 2001, este projeto se tornou a ONG Médicos Solidários, gerida por um conselho formado por alguns dos médicos participantes da rede.

 

Unidade Municipal de Assistência Médica Primária de Costa Barros (1998-2001)

Em 1998, MSF iniciou um projeto na Unidade Municipal de Saúde de Costa Barros (UMAMP Sylvio Frederico Brauner), situada em uma área muito pobre e violenta do Rio de Janeiro, em parceria com a Prefeitura da cidade, com o objetivo de criar uma nova dinâmica para o atendimento à saúde.

Costa Barros era uma área formada por 7 comunidades carentes, onde moravam aproximadamente 45 mil pessoas. A UMAMP era a única unidade de saúde local e não estava funcionando em sua plena capacidade devido ao contexto de violência na comunidade – o atendimento estava cada vez mais difícil e chegou a cair para algumas centenas de consultas ao mês, sendo que a unidade tinha capacidade para 4.500 atendimentos por mês. A parceria estabelecida entre MSF e a Prefeitura do Rio de Janeiro foi caracterizada por um modelo de cogestão, segundo o qual uma equipe de MSF trabalhava lado a lado com uma equipe da Prefeitura. Com a intervenção de MSF, a unidade passou a oferecer assistência ginecológica – incluindo obstetrícia e oferecendo pré-natal –, pediátrica e psicológica, e aumentou a cobertura das atividades curativas e preventivas.

Além do atendimento primário à saúde nos programas da mulher, da criança, de hipertensão e diabetes, entre outros, a unidade conta também com a atuação de agentes comunitários de saúde, que são moradores locais, treinados pelo projeto. Eles fazem o elo entre o Posto de Saúde e a comunidade, realizando visitas domiciliares e atividades de prevenção. A equipe também assessora a organização de fóruns locais, quando a comunidade se reúne para identificar problemas e buscar soluções.

A UMAMP é também a primeira referência para o Programa da Saúde da Família (PSF) que MSF desenvolveu no conjunto habitacional de Portus. Em 2001, o projeto em Costa Barros foi repassado para a ONG Campo.

Depoimento

“Eu queria conhecer essa realidade. É um mundo totalmente diferente. Aqui você fica realmente perto dos pacientes. Eu amo os meus velhinhos, eles são demais, eles são super up. Tenho uma paciente de 82 anos que eu tive de alertar para usar camisinha, porque ela é muito namoradeira”. Dra. Rosana Chaowey Wo, médica de MSF.

 

Núcleo Comunitário, Social e de Saúde de Portus (1998-2001)

Portus era uma comunidade do bairro de Costa Barros, na zona norte do Rio de Janeiro, formada com o objetivo de abrigar moradores de rua e de áreas de risco de diversas partes do Rio, contabilizando quase 1000 famílias. Na época, MSF já trabalhava com parte das pessoas transferidas na favela do Coqueirinho, debaixo de um viaduto da cidade, e acompanhou-as até Portus. Lá, as pessoas receberam uma casa, porém, ainda havia a necessidade de oferecer a eles apoio à integração social e assistência à saúde. Foi neste âmbito que MSF desenvolveu seu trabalho na nova comunidade, através do Programa de Saúde da Família (PSF).

O atendimento é realizado a partir do Núcleo Comunitário Social e de Saúde de Portus, através de uma equipe formada por um médico, um enfermeiro, um técnico de enfermagem, uma assistente social e cinco agentes comunitários de saúde. Todas as famílias são cadastradas e monitoradas pelos agentes, através de visitas domiciliares.

A assistência à saúde é feita principalmente com ações preventivas. As pessoas que precisam de um atendimento mais especializado são referenciadas à Unidade Municipal Social e de Saúde de Costa Barros ou a outras unidades da rede pública de saúde, e a equipe de MSF acompanha os tratamentos.

Em Portus, são também desenvolvidas atividades sociais e de educação em saúde. Uma assistente social orienta e auxilia na obtenção de documentos e busca de trabalho. A equipe presta assessoria para a realização de fóruns comunitários, que são encontros mensais onde os moradores se reúnem para levantar os principais problemas da comunidade.

As atividades sociais foram realizadas em parceria com a ONG comunitária CIACOM (Centro Integrado de Ações Comunitárias), montada por moradores que participaram do curso de Capacitação de Gestores Comunitários, organizado por MSF.

Em outubro de 2001, foi realizada uma pesquisa para medir a satisfação da comunidade com o serviço. Os resultados mostraram que, nos 6 meses anteriores, 76,2% das famílias da comunidade havia frequentando o núcleo de saúde da família pelo menos uma vez, sendo que 39,6% disseram se tratar exclusivamente em Portus. 77,1% das famílias que frequentam o núcleo consideram que o atendimento recebido resolveu seus problemas de saúde e 86,2% das casas receberam visita domiciliar médica. Em novembro de 2001, o projeto foi repassado para a ONG Campo.

Depoimento

“Muitas vezes a gente não tem dinheiro pra gente próprio ir ao médico ou pra levar um filho da gente. A gente já tem médico aqui perto, às vezes a criança passa mal, a gente não precisa ir tão longe que aqui mesmo tem”. Norivalda Isaías, moradora de Portus, Rio de Janeiro.

 

I e II Projetos de Capacitação de Gestores Comunitários (1997-2001)

Capacitação de Gestores Comunitários

Capacitar moradores de comunidades carentes para que eles possam gerir organizações comunitárias ou atuar nas já existentes, desenvolvendo projetos sociais e de saúde, foi o principal objetivo do projeto de Capacitação de Gestores Comunitários (CGC), que MSF desenvolveu entre 1997 e 2000 no Rio de Janeiro.

A necessidade de capacitar pessoas da própria comunidade surgiu a partir da experiência de MSF em Vigário Geral, em 1997, quando foi realizado o primeiro curso de capacitação de gestores, do qual participaram moradores de Vigário Geral e de outras comunidades.

O projeto realizou dois cursos de, em média, um ano e meio de duração cada, sendo um semestre de curso teórico e um ano de aplicação prática. Os dois projetos de Capacitação de Gestores Comunitários (CGC I e II) contaram, no total, com a participação de 54 alunos de 13 comunidades diferentes, que tiveram aulas de Redação e Expressão, Relações Humanas, Contextualização Social e Política, Ética Comunitária e Administração e Gestão de Projetos Comunitários, entre outras disciplinas. A partir dos cursos, foram criadas seis entidades comunitárias, que atuam nas comunidades de Vigário Geral, Parada de Lucas, Portus (Costa Barros), Marcílio Dias (Maré), Dique (Jardim América) e Telégrafos (Mangueira).

Durante um período de 10 meses, as entidades contaram com recursos de um fundo, mantido por MSF, de R$ 300,00 por mês para cada entidade, com o qual elas puderam iniciar e consolidar o trabalho junto às suas comunidades.

Em 10 meses, foram gastos R$ 48 mil, que beneficiaram diretamente mais de 8 mil pessoas. Com isso, a média de custo por pessoa beneficiada pelos projetos foi de apenas R$ 0,59 por mês. Estes resultados foram apresentados durante seminário realizado no início de junho de 2000, com o objetivo de apoiar os gestores na busca de novos financiadores.

Os projetos desenvolvidos abrangem uma série de atividades: educação (reforço escolar e alfabetização de adultos), escolinhas de capoeira e de futebol, projetos de geração de renda e crédito popular, produção de multimistura para combater a desnutrição infantil e palestras de orientação aos pais.

Outros cursos de capacitação comunitária, inspirados no projeto de Médicos Sem Fronteiras, foram realizados por organizações governamentais e não governamentais no Rio de Janeiro, em Belo Horizonte e em Salvador.

Pessoas beneficiadas pelo trabalho das organizações ou núcleos comunitários por mês:

CIACOM (Portus) 1500
CIATE (Mangueiras) 1500
CPS LUCAS (Parada de Lucas) 110
GMCD (Marcílio Dias) 223
MOGEC (Vigário Geral) 4700
NIADS (Dique) 1500
TOTAL 9533

Depoimento

“O grande saldo deste desafio foi a possibilidade de transformação: no lugar da violência e da corrupção dos vários poderes existentes nas comunidades, encontramos ética e transparência; no lugar do abandono, encontramos compromisso, cuidado, solidariedade; no lugar da omissão, encontramos participação e organização rumo ao fortalecimento da cidadania.” Elaine Monteiro, ex-coordenadora social de Médicos Sem Fronteiras/Rio.

 

Programa Local de Prevenção a DST/Aids (1996-2001)

Na década de 90, o perfil epidemiológico da Aids mudou: cada vez mais mulheres e jovens heterossexuais, especialmente da população socialmente excluída, foram contaminados. Entre 1998 e 2001, MSF desenvolveu, em comunidades empobrecidas da zona norte do Rio de Janeiro, um projeto piloto de banco de preservativos. A ação consistiu na distribuição regular de preservativos para usuários cadastrados e na realização de oficinas temáticas para homens e mulheres, heterossexuais e homossexuais.

O objetivo era envolver as populações empobrecidas na prevenção das doenças sexualmente transmissíveis (DST) e da Aids, através de atividades em que elas pudessem receber informações, aprender a se prevenir e ter acesso gratuito a camisinhas.

O diferencial deste projeto, nomeado “Programa Local de Prevenção a DST/Aids”, foi que o banco de preservativos era gerido por voluntários das próprias comunidades beneficiadas, com assessoria da equipe de MSF. A resposta favorável da população estimulou a organização a ampliar o número de comunidades atendidas.

Em 2001, os bancos de preservativos foram repassados para duas áreas de planejamento do município do Rio de Janeiro (CAP 3/1 e CAP 3/3) e para unidades de saúde mais próximas, que ficaram responsáveis pela coleta de dados nas comunidades, reciclagem e abastecimento de preservativos.

Depoimento

“O Programa Local de Prevenção em DST/Aids (PLP) é uma experiência pioneira pela visão social que possui, porque ensina a implementar, fomentar e gerir os bancos de preservativos, contribuindo para o fortalecimento das lideranças comunitárias e a da própria comunidade. (…) A forma como MSF desenvolveu o projeto fez com que os líderes comunitários se preparassem para caminhar com suas próprias pernas.” Ângelo Márcio da Silva, presidente do CIADS (Centro Integrado de Ações de Desenvolvimento Social), ONG originada pelo Curso de Capacitação de Gestores Comunitários que gerencia um dos bancos de preservativos.

 

Dentemania (1998-1999)

Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) mostram que, no Brasil, crianças de 12 anos já têm, em média, cinco dentes, num total de 28, prejudicados pela cárie de forma permanente. Esta realidade é ainda mais grave entre crianças de famílias carentes.

Entre julho de 1998 e dezembro de 1999, MSF realizou um trabalho de ensino e manutenção da higiene bucal com meninos e meninas de 4 a 12 anos vivendo na rua, e em comunidades carentes como Vigário Geral e Caju. No atendimento odontológico, a equipe enfrentou o desafio de dar informações e tirar dúvidas sobre saúde bucal, de uma maneira criativa, prática, simples e barata. Foi assim que surgiu o Dentemania, um conjunto de jogos educativos que pode ser explorado de diferentes formas e que permite ao público infantil utilizar a experiência e a linguagem do seu dia-a-dia.

O Dentemania estimula os jogadores, ao mesmo tempo em que facilita o desenvolvimento das atividades educacionais. Compõe-se de um jogo de memória, um tabuleiro, um cartaz desmontável que simula detalhes da anatomia da boca e um manual explicativo.

Em conjunto com a Secretaria Municipal de Educação (SME/RJ), MSF treinou professores e coordenadores pedagógicos da rede municipal de ensino fundamental para serem agentes multiplicadores na utilização do material educativo. Foram distribuídas gratuitamente 3500 unidades, a escolas municipais de ensino fundamental no Rio de Janeiro, postos de atendimento odontológico da rede pública, unidades básicas de saúde, instituições de assistência a crianças e a alguns municípios fora do Rio (Belo Horizonte, Salvador, Recife, São Paulo e Brasília). O número de crianças nas instituições beneficiadas pode ser estimado em mais de 1 milhão.

Depoimento

“Eu achei o jogo muito legal. Aprendi que não pode deixar a escova de dente de cabeça para baixo no copo…”. Gisele, 6 anos.

 

Vigário Geral (1995-1998)

Em agosto de 1993, a chacina de Vigário Geral chamou a atenção da opinião pública internacional para a situação de exclusão social e violência cotidiana em que vive grande parte da população do Rio de Janeiro. Depois de uma avaliação de campo, onde foram checadas as condições de saúde e psicossociais da comunidade, em janeiro de 1995, MSF decidiu intervir em Vigário Geral.

As atividades começaram com a instalação de um Posto de Saúde na comunidade. O desafio deste projeto foi mostrar que, mesmo em um contexto precário, é possível intervir, montar e fazer funcionar um bom serviço de assistência à saúde, com a participação da comunidade. Inicialmente, o atendimento no Posto estava voltado somente a crianças e adolescentes, mas a demanda por parte dos adultos tornou-se cada vez maior. Com o envolvimento da comunidade, através da criação de uma cooperativa de saúde popular, o atendimento aos adultos foi viabilizado. No Posto, além do atendimento de clínica geral, ginecologia e obstetrícia e pediatria, eram oferecidos serviços de odontologia, psicologia, serviço social, consultas e procedimentos de enfermagem. O Posto de Saúde de Vigário Geral oferecia também os programas de Saúde da Mulher, Pré-natal, da Criança e do Adolescente, Prevenção do Câncer de Mama e Colo do Útero e Prevenção de DST/Aids. No final de 1997, havia 1573 crianças e adolescentes regularmente inscritos no serviço, e mais 120 gestantes e 200 adultos, totalizando 1893 inscritos.

 

Amazônia (1991-2002)

A primeira equipe de MSF chegou ao Brasil em 1991, para combater uma epidemia de cólera entre o Amazonas e a Colômbia. Com o aumento dramático de casos de malária no estado de Roraima, principalmente entre as populações indígenas, nas terras dos índios Yanomami, MSF foi convidada a desenvolver um projeto de longo prazo na área em saúde preventiva.

Em 1994, a equipe estendeu suas atividades a outros grupos, atendendo também algumas populações do noroeste do estado do Amazonas como os Macuxi, Wapixana, Ingariko, Tuarepang, Patamona e Wai-wai.

Em 1997, um novo projeto foi iniciado nas terras dos Yanomami, onde MSF instalou um sistema básico de saúde funcional para as populações indígenas, que passou a ser administrado pelos próprios índios.

Na região do Vale do Javari, as equipes desenvolveram a formação de Agentes Indígenas de Saúde (AIS) e Microscopistas Indígenas de Malária (MIM) entre as etnias Matis, Kanamary, Marubo, Maioruna e Culina.

Em 1999, MSF iniciou mais um trabalho em Tefé, que atingiu as etnias Miranha, Kanamary, Kambeba, Kokama, Maku, Ticuna, Deni, Madija-Kulina, Mayuruna e Katukina. Em parceria com a FUNASA (Fundação Nacional de Saúde) e a Uni-Tefé (União das Nações Indígenas de Tefé), MSF ajudou a suprir a carência de um trabalho de saúde preventiva entre as populações indígenas, normalmente mais suscetíveis a qualquer forma de doença e infecção. Os maiores desafios foram combater a malária, a tuberculose, infecções respiratórias e diarreias, respeitando e promovendo a saúde tradicional dos índios.

No final de 1999, o governo brasileiro criou os Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI) para oferecer aos indígenas atendimento médico e de enfermagem, vacinação, saúde bucal, prevenção de doenças sexualmente transmissíveis, educação em saúde e encaminhamento aos hospitais mais próximos. A partir desta iniciativa, Médicos Sem Fronteiras passou a trabalhar com o governo na estruturação dos DSEIs durante dois anos. Com a implementação dos DSEIs, MSF finalizou suas atividades planejadas e decidiu, após 10 anos, encerrar as ações na região, uma vez que os povos indígenas atendidos por MSF já tinham acesso a cuidados básicos de saúde.

 

Dados referentes a 2020

6.490

Consultas ambulatoriais de COVID-19

1.080

Pacientes internados por COVID-19

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