Diretor da Campanha de Acesso a Medicamentos Essenciais avalia Reunião da ONU sobre a Aids

Dr. Tido von Schoen-Angerer considera positivo o compromisso de tratar 15 milhões de pessoas até 2015, mas pondera que preços altos de medicamentos podem ser barreira

Dez anos atrás, eu estava trabalhando como médico na Tailândia, onde tínhamos acabado de abrir o primeiro programa de tratamento de Aids de Médicos Sem Fronteiras. Desde aquele primeiro projeto, testemunhamos repetidas vezes como o tratamento salva vidas e mantém as pessoas saudáveis.

O compromisso de tratar 15 milhões de pessoas até 2015 é um passo decisivo e o relógio começou a correr agora. Esta meta reconhece a evidência de que o tratamento não apenas salva vidas, mas também previne a transmissão do vírus. Estudos recentes provam que começar o tratamento mais cedo é fundamental para a prevenção de doenças oportunistas, como a tuberculose, e reduz em cerca de 96% as chances de transmissão do HIV.

Fazer do tratamento uma das mais importantes ferramentas de prevenção é uma forma de nos anteciparmos a uma nova onda de infecções. Mas precisamos que o tratamento seja integrado em todas as clínicas instaladas em locais onde a doença é endêmica. Isto também vai reduzir o número de mortes causadas pela tuberculose, principal causa de morte de pessoas que vivem com HIV.

Existem formas de levar os cuidados a mais pessoas, reduzir o trabalho com os pacientes e os custos com o tratamento. Uma dessas maneiras é oferecer tratamento integrado de HIV e outras doenças em clínicas e postos de saúde rurais, ensinar as enfermeiras – e não apenas os médicos – a oferecer tratamento aos pacientes e fazer a profilaxia pós-exposição (tratamento preventivo para evitar que pessoas que tenham sido expostas ao vírus sejam infectadas). Outra possibilidade é estimular que os vizinhos se revezem para buscar medicamentos, como fazemos em Moçambique. Ou ainda oferecendo tratamento para HIV e TB em uma única clínica, como na Suazilândia, ou indo ao encontro do paciente no caso de tratamento da TB resistente, como fazemos na África do Sul.

Preços – A integração e a introdução dos medicamentos antirretrovirais significa que os medicamentos devem ser acessíveis. Apesar dos preços de medicamentos terem caído em 99% na última década, graças à competição com os genéricos, outra crise de preços está se aproximando. Nós precisamos ter acesso a novos medicamentos, com menos efeitos adversos para substituir os antigos que já adquiriram resistência ao vírus. Mas com as patentes bloqueando a produção acessível de novos medicamentos, nós não veremos os preços diminuindo, como ocorreu com a primeira geração de medicamentos contra a Aids – a menos que os governos ajam de maneira decisiva.

É preciso tomar medidas para garantir que a concorrência de preços continue. A flexibilidade do Acordo Relativo aos Aspectos do Direito da Propriedade Intelectual Relacionados com o Comércio (TRIPS, na sigla em inglês) deve ser utilizada para se sobrepor às barreiras de patentes. Entretanto, a única flexibilidade mencionada especificamente na declaração final da reunião de Nova Iorque, para países que não fazem seus próprios medicamentos, não funciona e precisa ser reformulada, não reafirmada.

Os governos que escolherem aumentar o acesso a medicamentos por meio de licenças compulsórias, não podem sofrer retaliações. Dez anos atrás, na Declaração de Doha sobre o Acordo de Trips e Saúde Pública, os países se comprometeram a não submeter a saúde aos interesses comerciais, justamente para evitar situações como essa. Os países devem parar de aprovar acordos comerciais que exigem regras mais rígidas de patentes do que o previsto no acordo TRIPS. Mecanismos novos e inovadores de aumento do acesso aos medicamentos em países em desenvolvimento, como o “Pool” de Patentes de Medicamentos, devem ser apoiados.

Estamos em um momento decisivo. As lições para o tratamento de HIV/Aids aprendidas na última década, combinadas com as evidências científicas mais recentes que mostraram que tratamento também é prevenção e podem nos ajudar a frear a epidemia.

Agora temos o compromisso de oferecer o tratamento a 15 milhões de pessoas até 2015, o que vai nos ajudar a salvar vidas e parar o vírus.

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