Violência na República Democrática do Congo coloca pessoas e instalações médicas sob fogo cruzado

Desde março de 2022, o aumento dos confrontos armados na província de Kivu do Norte, ligado ao ressurgimento do movimento M23, forçou mais de 1 milhão de pessoas a fugir de casa

República Democrática do Congo
© Laora Vigourt/MSF

Instalações médicas apoiadas por equipas da Médicos Sem Fronteiras (MSF) têm recebido elevados números de pacientes feridos de guerra, à medida que cada vez mais pessoas fogem da última vaga de confrontos armados na província de Kivu do Norte, no Leste da República Democrática do Congo (RDC).

Com civis e unidades de saúde apanhados no fogo cruzado, a MSF insta todas partes do conflito a garantirem urgentemente a segurança de pacientes e de profissionais médicos, assim como a proteção de civis e um acesso sem restrições das organizações humanitárias às comunidades deslocadas e afetadas pela violência.

No seguimento da escalada do conflito entre vários grupos armados na área, desde 22 de janeiro, cerca de 10 000 pessoas fugiram de casa em Mweso e arredores, no território de Masisi, e procuraram refúgio no hospital geral de Mweso.

 

O hospital [de Mweso] está sobrelotado com milhares de pessoas que tentam encontrar alguma proteção dos combates.”

– Caglar Tahiroglu, coordenadora do projeto da MSF

 

Em janeiro, e em particular nas últimas duas semanas desse mês, as equipas da MSF nesse hospital gerido pelo Ministério da Saúde prestaram tratamento a 67 feridos de guerra, a maioria por ferimentos de balas e de explosões. Mais de 50 desses pacientes eram civis, incluindo 21 crianças com menos de 15 anos. Além disso, as equipas da MSF providenciaram apoio psicológico e distribuíram abrigos temporários, filtros de água e sabão a pessoas recém deslocadas.

Com os confrontos a intensificarem-se nos últimos dias, o número de pessoas abrigadas no hospital diminuiu, pois muitas fugiram da área em direção a Kitshanga, Katsiru, Nyanzale, Pinga, Kalembe e Kashunga. Contudo, há pelo menos 2 500 pessoas, incluindo crianças cujos pais foram mortos, que continuam refugiadas no hospital de Mweso.

“A situação é extremamente preocupante”, sublinha a coordenadora do projeto da MSF, Caglar Tahiroglu. “O hospital está sobrelotado com milhares de pessoas que tentam encontrar alguma proteção dos combates. Estamos a dar o nosso melhor em conjunto com o Ministério para ajudar toda a gente, mas não temos alguns bens essenciais, como alimentos.”

 

Conflito propaga-se para Sul

República Democrática do Congo - Kivu do Sul
Os confrontos também causaram uma vaga de deslocações na província de Kivu do Sul. © Igor Barbero/MSF

Os confrontos recentes também causaram uma nova vaga de deslocações no outro lado da fronteira, na província de Kivu do Sul, onde já tinham fugido de casa quase 155 000 pessoas desde dezembro de 2022. Nos últimos dias, chegaram milhares de pessoas em pânico às vilas fronteiriças de Bweremana e de Minova, mais a Sul.

Profissionais médicos no hospital de Minova, onde a MSF presta apoio, trataram cerca de 30 pessoas feridas entre 2 e 6 de fevereiro, incluindo quatro crianças, 10 mulheres e 12 pessoas que necessitavam de cirurgia.

Além disso, a estrada entre a capital de Kivu do Norte, Goma, e a vila de Shasha, a 27 quilómetros de distância, está intransitável devido aos confrontos. Por isso, as pessoas em centros de saúde em Kivu do Norte estão a ser encaminhadas para o hospital geral de Minova e para outras instalações em Kivu do Sul, sobrelotando-as com pacientes, incluindo um número crescente de sobreviventes de violência sexual.

“Atualmente, as instalações de saúde em Minova estão sobrelotadas e enfrentam uma escassez de medicamentos essenciais para tratar condições comuns como malária, diarreia, desnutrição e infeções respiratórias”, explica a coordenadora de emergência da MSF em Kivu do Sul, Rabia Ben Alí. “Ao longo das últimas quatro semanas, observámos que o número de casos de violência sexual tratados no hospital duplicou.”

 

Sob fogo cruzado

À medida que os combates se intensificam e aproximam das cidades de Mweso e Minova, a segurança de civis, profissionais médicos e pacientes fica cada vez mais em risco.

Várias casas foram atingidas por explosivos no centro da cidade de Mweso, matando civis. Só na semana de 22 de janeiro, cerca de 20 civis foram mortos, incluindo uma criança, e mais 41 foram feridos. Na última semana do mês de janeiro, balas de fogo cruzado atingiram a base da MSF e o hospital de Mweso, ferindo um profissional. A 2 de fevereiro, a área entre o hospital de Mweso e a base da MSF foi atingida por um explosivo.

Devido a preocupações relativas à segurança das equipas, a MSF decidiu deslocar temporariamente alguns profissionais de Mweso para Minova.

“Continuamos a providenciar apoio – de maneira maioritariamente remota – ao hospital de Mweso, assim como a nove outros centros de saúde na área”, esclarece a coordenadora do projeto. “Os nossos profissionais regressarão assim que a situação o permita. No entanto, não podemos providenciar cuidados médicos nestas condições, onde as instalações de saúde não são protegidas e profissionais médicos são apanhados pelo fogo cruzado.”

 

*Dados da Organização das Nações Unidas (ONU)

 

Desde março de 2022, o aumento dos confrontos armados na província de Kivu do Norte, ligado ao ressurgimento do movimento M23, forçou mais de 1 milhão de pessoas a fugir de casa e causou um desastre humanitário numa província devastada por mais de 30 anos de conflito armado e deslocações em massa. 

Partilhar
Share on facebook
Share on twitter
Share on linkedin
Share on whatsapp
Share on print